SINDICATO DOS TRABALHADORES DO JUDICIÁRIO FEDERAL E MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO - FUNDADO EM 28 DE NOVEMBRO DE 1998 - FILIADO À FENAJUFE E CUT

DESTAQUE

Após reação, pedido de providências contra juí­za Valdete Souto Severo, por publicação de artigo crí­tico ao governo, é arquivado

Na última sexta-feira, 14, foi arquivado o pedido de providências instaurado contra a juí­za Valdete Souto Severo por conta de um artigo crí­tico ao governo de Jair Bolsonaro (sem partido), publicado em julho no site Democracia e Mundo do Trabalho em Debate . O artigo, intitulado Por que é possí­vel falar em polí­tica genocida no Brasil em 2020? , foi alvo de questionamento do corregedor nacional de Justiça, ministro Humberto Martins, que determinou a instauração pedido de providências para que a juí­za prestasse informações sobre o texto. Na ocasião, o Sintrajufe/RS publicou nota de solidariedade e apoio a Valdete.

No artigo, a juí­za critica o governo pelos ataques a direitos dos trabalhadores e das trabalhadoras em meio à pandemia. Ao mesmo tempo, denuncia a falta de medidas de proteção à saúde e à vida da população.

Dois trechos do artigo de Valdete eram destacados pelo corregedor no pedido de providências:

[…]. Enquanto quem ocupa o cargo de Presidente adota essa postura, outros sujeitos que estão em posição de poder também atuam fortemente para aprovar regras que majoram jornada, reduzem salário, retiram direitos, atingem populações originárias, destroem o ambiente. Regras propostas pelo Executivo, chanceladas pelo Parlamento e ratificadas pela cúpula do Poder Judiciário. […]. Eis por que é possí­vel falar de uma polí­tica genocida no Brasil hoje. O governo segue, em meio à pandemia, não apenas editando regras que concretamente pioram a vida das pessoas, impedindo-as, em alguns casos, de continuar vivendo, como também deliberadamente deixando de aplicar recursos de que dispõe, no combate à pandemia”.

Reação e arquivamento

Após a instauração do pedido de providências, houve forte reação social contra a tentativa de silenciamento da denúncia feita pela juí­za Valdete, que nada fez além de retratar o que ocorre no Brasil. Assim como o Sintrajufe/RS, diversas entidades sindicais e representativas e movimentos populares divulgaram notas em apoio e solidariedade à Valdete, defendendo a necessidade de adoção de uma postura crí­tica e incisiva, como fez a juí­za, em relação à condução do governo em meio à pandemia.

Nessa sexta, finalmente, o corregedor recuou e decidiu pelo arquivamento do pedido de providências. Segundo o corregedor, verificou-se que o artigo não pode ser caracterizado como infração aos deveres da magistratura, uma vez que, devido ao contexto e o veí­culo no qual foi publicado, tangencia o teor crí­tico-acadêmico, tratando-se, portanto, de obra técnica que não pode ser tida como atuação polí­tico-partidária e nem tampouco caracteriza manifestação de opinião sobre processo em andamento, adequando-se à resolva prevista no artigo 36, III, segunda parte, da Lei Orgânica da Magistratura Nacional: “Denota-se, em verdade, que a publicação do artigo em sí­tio eletrônico que detém conexão com o tema trabalhista, área de sua atuação preponderante, a juí­za apenas exerceu regularmente sua liberdade de expressão, não se vislumbrando qualquer intenção deliberada de ofender as normas previstas na Loman, no Código de Ética da Magistratura Nacional ou na Resolução 305/2019”, afirma a decisão.

O corregedor ressaltou ainda que a Constituição também dispõe a respeito da impossibilidade de magistrados se dedicarem à atividade polí­tico-partidária. Porém, o ministro lembra que, à época, nem sequer se cogitava que, em um futuro razoavelmente próximo, existiram ferramentas digitais capazes de conectar pessoas por todo o mundo, bem como era inimaginável que a manifestação de qualquer pessoa pudesse atingir uma quantidade incalculável de indiví­duos em poucos minutos: “Nesse sentido, tratando-se de tema ainda novo, é preciso adotar-se cautela e analisar com atenção fatos que eventualmente possam vir a configurar violação aos deveres impostos aos magistrados, de modo a delimitar quais são os comportamentos que efetivamente ultrapassam os limites do legí­timo exercí­cio da liberdade de expressão garantido aos juí­zes sem que se coloque em risco a independência e a imparcialidade que a sociedade espera”, enfatizou o corregedor nacional.

Com informações do site Consultor Jurí­dico.