SINDICATO DOS TRABALHADORES DO JUDICIÁRIO FEDERAL E MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO - FUNDADO EM 28 DE NOVEMBRO DE 1998 - FILIADO À FENAJUFE E CUT

SINDICÂNCIA E PUNIÇÃO

Médicos são perseguidos por prefeitura e conselho por realizarem procedimentos de aborto legal

Dois médicos foram suspensos do exercício profissional por realizarem abortos previstos em lei. O caso ocorreu em São Paulo e está sendo denunciado por entidades sindicais como uma perseguição a esses e outros profissionais desencadeada pela Prefeitura da cidade, comandada por Ricardo Nunes (MDB) e pelo Conselho Regional de Medicina (Cremesp).

Dirigente da CUT e do Sindicato dos Médicos de São Paulo (Simesp), a médica Juliana Salles explicou que os ‘prontuários de pacientes foram acessados de forma ilegal na unidade’, e encaminhados ao conselho para que, a partir dessas informações, passassem a punir os médicos. “Os trabalhadores da saúde vêm sendo perseguidos pela prefeitura de São Paulo e pelo Cremesp. Primeiro, acessaram os prontuários de forma ilegal, já que não deveriam ser abertos sem um rito formal. Mas ainda assim, a prefeitura pegou [os prontuários], mandou para o Cremesp, que abriu uma sindicância, resultando na suspensão do exercício profissional de dois médicos”, diz Juliana.

A médica lembra que o histórico recente do Conselho também carrega questões como a defesa de métodos sem comprovação científica no contexto da pandemia de covid-19: “É o mesmo Cremesp que indiciou cloroquina na pandemia e que fala em uma falsa autonomia médica para justificar práticas que não são consagradas pela ciência ou pela Justiça, mas por conceitos morais ou discussões fundamentalista no campo da ciência. É inadequado”, explica.

Após as diversas mobilizações e manifestações contra a perseguição e a convocação de uma plenária que acabou alcançando profissionais de outras localidades, um documento foi elaborado e assinado por mais de 100 entidades da sociedade civil, entre elas a CUT. Trata-se do Manifesto em defesa das trabalhadoras e trabalhadores dos erviço de direitos reprodutivos: “As trabalhadoras e trabalhadores dos serviços de direito reprodutivos, incluindo os serviços de aborto legal, juntamente com as entidades apoiadoras abaixo, vem através desse manifesto reiterar a defesa ao seu exercício profissional adequado, baseado nos mais avançados e comprovados métodos científicos que garantem a mulher o mais adequado tratamento, incluindo os abortos com as justificativas previstas em lei (chamados abortos legais)”, diz trecho do manifesto.

Acesse AQUI a íntegra do manifesto.


No início do mês, um ato público foi realizado pela reabertura do serviço de aborto legal no Hospital Municipal e Maternidade da Vila Nova Cachoeirinha, na zona norte de São Paulo. Os procedimentos foram suspensos por decisão do prefeito Ricardo Nunes. A unidade, que funcionava havia mais de 30 anos, era uma das poucas no país que realizavam esse tipo de atendimento. Durante todo esse período, a unidade foi referência no procedimento. Veja abaixo reportagem da TVT sobre o protesto:

PL do Estupro

Para Juliana Salles, a ofensiva contra o aborto legal tem respaldo no conservadorismo das gestões tanto do Cremesp como o Conselho Federal de Medicina (CFM): “Para além do PL 1904, existem resoluções de instâncias como os conselhos de medicina. Parece uma ação coordenada para que a mulher se submeta aos riscos e à violência. O CFM, assim como os regionais, regulam a ética médica. Todos os médicos inscritos deveriam fazer essa interface da prática médica com a população, mas hoje os conselhos são povoados por médicos bolsonaristas. O último grupo que assumiu o Cremesp é de extrema direita e leva a cabo o conceito fundamentalista e não a ciência”, afirma.

O projeto de lei (PL) 1.904/2024, ao qual a dirigente se refere, ficou conhecido como “PL do Estupro”, e qualifica como homicídio o aborto a partir de 22 semanas de gestação, mesmo em casos de estupro – no Brasil, a cada oito minutos, uma menina ou mulher é estuprada, conforme dados do Fórum de Segurança Pública. Atualmente, a legislação permite o aborto em apenas três casos, todos eles sem limite de tempo de gestação: se a gravidez for resultante de um estupro; se colocar a vida da mãe em risco; ou se o feto for anencéfalo. Em junho, foram realizados protestos em diversas cidades do Brasil contra o projeto.

Situação recorrente

Justamente em meio às discussões sobre o PL do Estupro, casos como o de São Paulo não são isolados. Na última semana, o Sintrajufe/RS publicou matéria sobre situação ocorrida em Goiás. A Justiça do estado está impedindo que uma menina de 13 anos, grávida após um estupro, realize um aborto legal e seguro. Ela decidiu interromper a gestação quando estava com 18 semanas, mas, com as recusas do hospital e da Justiça e a interferência de grupos religiosos antiaborto, já se encaminha para a 28ª semana.

No ano passado, ganharam repercussão os casos de meninas em Santa Catarina e no Piauí em que juízes obstruíram o direito ao aborto de meninas vítimas de estupro e tentaram induzi-las a manter os fetos.

Com informações da CUT