O Supremo Tribunal Federal (STF) está julgando em conjunto uma série de ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs) que questionam partes da emenda constitucional 103/2019, a reforma da Previdência aprovada pelo governo de Jair Bolsonaro (PL). Essas ADIs, movidas por diferentes entidades, pedem que o STF reconheça que determinados itens da reforma violaram a Constituição Federal e, portanto, deveriam deixar de valer. Entre esses itens, estão a progressividade das alíquotas, a possibilidade de que a contribuição dos aposentados e pensionistas incida sobre o que superar o salário mínimo, a instituição de contribuição extraordinária, o fim da “imunidade do duplo teto” e as mudanças na forma de cálculo da pensão.
Estão em julgamento as ADIs de números 6254, 6255, 6256, 6258, 6271, 6279, 6289, 6361, 6367, 6384, 6385, 6731 e 6916, ajuizadas por associações de defensores públicos, magistrados, membros do Ministério Público, auditores fiscais, partido político e delegados e agentes da Polícia.

Julgamento aguarda conclusão
No dia 19 de junho, o Supremo formou maioria para derrubar alguns dos pontos questionados nas ações. O julgamento, porém, foi suspenso por pedido de vista do ministro Gilmar Mendes – quando faltava apenas o voto dele para ser apresentado –, o que faz com que todos os votos ainda possam ser modificados. Mesmo assim, até o momento, estão sendo derrubadas, entre outras questões, as possibilidades de cobrança de contribuição extraordinária e de que as alíquotas para aposentados, aposentadas e pensionistas incidam sobre o que ultrapassar um salário mínimo – e não sobre o que ficar acido do teto do Regime Geral, como era antes da reforma. Está empatada em cinco votos a cinco a votação sobre a progressividade das alíquotas.
Veja AQUI como está o julgamento e AQUI mais detalhes sobre as ações.

“STF julga a reforma da Previdência de 2019: o que pode mudar na sua vida?”
No dia 4 de julho, o Sintrajufe/RS realizou uma live sobre o tema. Com o mote “STF julga a reforma da Previdência de 2019: o que pode mudar na sua vida?”, o debate online contou com a presença do advogado Carlos Guedes e da advogada Cintia Bettio, do escritório Silveira, Martins, Hübner (SMH), que presta assessoria jurídica ao sindicato. Eles responderam às principais dúvidas sobre o julgamento. Veja AQUI como foi a live.
A partir desse debate online, o Sintrajufe/RS preparou vídeos com trechos específicos em que são respondidas as respectivas questões. Esses vídeos estão aqui reunidos e poderão servir para elucidar dúvidas sobre o julgamento e subsidiar servidores e servidoras para mobilizações e outras ações que posicionem o funcionalismo e o conjunto dos trabalhadores e trabalhadoras nesse debate.
Veja os vídeos da campanha para redes sociais

O julgamento no STF das ADIs sobre a reforma da Previdência de Bolsonaro atinge servidoras e servidores públicos federais, estaduais e municipais?
Sim. Das três grandes reformas previdenciárias dos últimos trinta anos, ela é considerada a mais drástica em relação aos servidores estaduais e municipais. O número de servidores atingidos se deu em todos os Poderes, em todas as unidades da federação. Então o julgamento vai ter um efeito direto sobre milhões de servidores públicos federais, estaduais e municipais.

De que tratam as ADIs já votadas no STF?
São 13 ADIs, que quase todas têm o mesmo objeto. Temos ADIs que se concentram mais especificamente nas alíquotas progressivas, alteração na contagem de tempo de contribuição e idade de servidores, regras de transição, majoração da base de cálculo – que, no caso dos servidores federais, aumentou de 11% para 14%; e, no caso dos servidores estaduais e municipais, esse limite máximo de 14% pode ser ultrapassado.

Se mantidas as regras da reforma da Previdência de Bolsonaro, como ficariam os descontos de aposentados e pensionistas?
Os aposentados e pensionistas já tiveram um ataque direto na reforma previdenciária de 2019 com o fim da imunidade do duplo teto, na questão das alíquotas progressivas e na majoração da alíquota base. Mas, além desses três ataques diretos, há também a possibilidade de instituição de contribuição previdenciária sobre o que ultrapasse o salário mínimo e uma contribuição extraordinária.

O julgamento das ADIs no STF também atinge servidores e servidoras da ativa?
Sim. É de interesse dos servidores e servidoras da ativa, também. Além do ônus que já temos com o aumento de contribuição e de idade, temos julgamento sobre as regras de transição e sobre a alíquota progressiva. E também tem a previsão de instituição de contribuição extraordinária, que atingiria tanto servidores da ativa quanto aposentados e pensionistas.

Se mantida a votação do STF com relação à incidência da contribuição previdenciária sobre o que exceder um salário mínimo, como já acontece no RS, como ficará o desconto dos aposentados e pensionistas?
Um dos pontos de divergência entre o voto do ministro Barroso e do ministro Fachin é que este declarava a inconstitucionalidade do dispositivo que prevê contribuição previdenciária do que ultrapasse o salário mínimo. E esse voto divergente foi acompanhado por mais sete ministros. E há maioria, de oito a dois, para declarar a inconstitucionalidade deste ponto. Sendo eliminada, nós voltaremos ao regime anterior, onde a contribuição só poderia ocorrer sobre os valores que ultrapassassem o teto do Regime Geral de Previdência.

A contribuição extraordinária e as alíquotas progressivas atingiram somente os servidores da ativa?
Não. A emenda prevê que a contribuição extraordinária vai incidir para servidores da ativa, aposentados e pensionistas. As alíquotas progressivas, também.

A reforma reduziu bastante o valor das pensões. Há votos no STF para reverter essa situação?
A reforma de 2019 introduziu alterações extremamente danosas. A fórmula de cálculo é muito complexa, mas, basicamente, a pensão seria correspondente a 50% do valor das aposentadorias ou das pensões. Só que, para chegar ao valor da aposentadoria ou pensão, há um cálculo que reduz esse valor, o que faz as pensões terem de 33% a 40% do valor das aposentadorias. A questão das pensões não constou na divergência, mas, ao final do julgamento, o ministro Alexandre de Moraes também expressou o interesse em revisar e trazer novamente a plenário.

Há alguma chance de as votações das regras de transição e do duplo teto serem retomadas?
A questão das regras de transição não foi mencionada nem no voto do ministro Barroso, nem no voto do ministro Fachin, que são os dois votos que estão polarizando o plenário. Essa questão não foi sequer discutida. Embora não concluído, na prática o julgamento implica na declaração de constitucionalidade das regras de transição. A questão do duplo teto também é objeto de ADIs que estão sendo julgadas, mas também é objeto de uma ADI anterior, cuja relatoria é do ministro Fachin. Então, independente do resultado do julgamento das treze ADIs, pode ser que nessa questão ainda haja uma segunda discussão.

O que mudaria para as mulheres servidoras públicas?
A distinção que foi feita em termos de cálculo de tempo de contribuição entre mulheres vinculadas ao Regime Geral e servidoras vinculadas a Regimes Próprios foi alvo de críticas. Mas no texto ficou patente essa diferenciação, sendo prejudicadas claramente mulheres ligadas a Regimes Próprios de Previdência. Essa norma foi objeto do voto divergente do ministro Fachin, declarando a inconstitucionalidade desse dispositivo, e mais sete ministros o acompanharam.

Essa mudança será para todos os estados da federação?
Na construção política da reforma, os governadores e os prefeitos das grandes capitais colocaram como condição a desnecessidade de leis complementares nacionais para regulamentar a reforma da Previdência. Eles obtiveram autorização para legislar em sentido diferente do legislado pela União. Então os servidores estaduais, em vários estados, já são diretamente atingidos pela contribuição ordinária acima de um salário mínimo. E essa questão específica, que já foi instituída em estados, se for mantido o julgamento no placar atual, teremos a derrubada desse dispositivo.

Como fica a questão do desconto previdenciário que passou a ser cobrado dos aposentados por invalidez grave?
A reforma trouxe a revogação completa do parágrafo da Constituição que era uma tentativa de reequacionar a situação dos servidores aposentados com doenças graves. Com a instituição, em 2003, da contribuição previdenciária sobre inativos e pensionistas, se chegou à conclusão de que era extremamente prejudicial aos servidores portadores de doenças graves. Então foi aprovado no texto permanente da Constituição o parágrafo 21, que foi revogado pela emenda 23. Existem ADIs específicas sobre essa questão, mas no julgamento que ocorreu ela não foi objeto de apreciação, o que significa a declaração da constitucionalidade da revogação feita em relação ao duplo teto para servidores aposentados com doenças graves. Mas existe outra ADI que trata dessa questão.

O placar do julgamento no STF pode ser modificado?
Sim. Está prevista a possibilidade de modificação do voto do ministro até o fim do julgamento.

Qual a repercussão do julgamento das ADIs no STF nas ações coletivas do Sintrajufe/RS contra dispositivos da EC 103/2019?
O Sintrajufe/RS foi o primeiro sindicato de servidores do país a ingressar com ação judicial discutindo a majoração da alíquota base e a instituição das alíquotas progressivas. Também há uma ação do Sintrajufe/RS discutindo a revogação das regras transição, para que as que estavam em curso antes da aprovação da emenda 103 voltem a ter efeito. As decisões em ADI valem para todos. Então, na prática, em relação a esses pontos que se encontram em julgamento, elas seriam aplicadas diretamente pela administração independentemente do resultado das ações de primeiro grau.

Se o STF confirmar a inconstitucionalidade, as reformas estaduais e municipais caem automaticamente? E há possibilidade de devolução desses valores cobrados acima de um salário mínimo?
Extrato da resposta: Toda a legislação federal, estadual e municipal que tenha como fonte direta a emenda constitucional 103, com o dispositivo declarado inconstitucional, cai também. E também garante a devolução dos valores que foram pagos a mais.

Como podemos avançar na luta para revogar toda a reforma do Bolsonaro?
Se o STF mantiver as decisões a partir das divergências levantadas pelo ministro Fachin, justiça em parte será feita. Mas elas não resolvem o problema do caráter confiscatória da reforma. Nós sabemos bem a pressão para que uma nova reforma da Previdência ocorra. Mas a nossa força está na atuação das entidades e na luta coletiva pela revogação da reforma. Só a luta dos trabalhadores e trabalhadoras pode superar os obstáculos.



