SINDICATO DOS TRABALHADORES DO JUDICIÁRIO FEDERAL E MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO - FUNDADO EM 28 DE NOVEMBRO DE 1998 - FILIADO À FENAJUFE E CUT

CHOQUES ELÉTRICOS E CASSETETES

Trabalhadores que estavam em situação análoga à escravidão denunciam participação de policiais no esquema

O resgate de 207 trabalhadores que estavam em situação análoga à escravidão em Bento Gonçalves segue trazendo revelações sobre a situação na qual se encontravam. Em depoimentos, alguns desses trabalhadores denunciaram até mesmo a participação de policiais militares no esquema, com agressões e ameaças a quem reclamasse das condições em que estavam vivendo e trabalhando.

Entenda o caso

O caso só foi descoberto porque um grupo conseguiu fugir e fazer a denúncia à Polí­cia Rodoviária Federal (PRF). Segundo a PRF, três trabalhadores procuraram os policiais na Unidade Operacional da PRF em Caxias do Sul e informaram que tinham acabado de fugir de um alojamento em que eram mantidos contra sua vontade. Eram cerca de 200 trabalhadores atuando para uma empresa terceirizada que prestava serviços a viní­colas como a Salton, a Aurora e a Garibaldi. Eles recebiam comida estragada, tinham de trabalhar com roupas molhadas, sem banho quente, e eram obrigados a realizar compras apenas em um mercadinho, com produtos superfaturados e o valor descontado dos salários, o que gerava dí­vidas dos trabalhadores com o aliciador, pretexto por meio do qual eram impedidos de deixar o local, sob ameaças a eles próprios e aos familiares que vivem na Bahia. Os trabalhadores também relataram terem sido ví­timas de violência fí­sica.

Policiais tinham acordo com dono do alojamento, disseram resgatados

Reportagem do jornal Pioneiro conta que os trabalhadores que conseguiram escapar e denunciar o esquema à PRF imploraram que a Brigada Militar não fosse acionada., por medo de represálias. Nos depoimentos, eles denunciaram que alguns policiais teriam um acordo com o dono do alojamento, sendo chamados mesmo estando de serviço, uniformizados, para resolver problemas relativos a queixas ou brigas entre os trabalhadores. Alguns desses PMs teriam usado de armas de choque elétrico e cassetetes para agredir quem reclamasse. Ameaças de morte também foram denunciadas.

Um trabalhador contou que ele e outros colegas foram espancados por seguranças com uma cadeira de ferro. Entre os seguranças, estariam policiais militares. Um desses policiais, identificado pelos trabalhadores como sargento , teria dito que quem reclamasse ou filmasse as condições da pousada seria morto . Um trabalhador denunciou que outros que reclamaram já teriam sido assassinados. Nos relatos, são mencionados dois soldados, mas o número pode ser maior, já que há outros indí­cios de que policiais fariam serviço particular para empresários da região.

Os depoimentos estão sendo encaminhados para a Polí­cia Federal e a Brigada Militar. A Corregedoria da Brigada Militar está investigando a participação dos policiais no caso.

Ministério tem mesmo quadro de 25 anos atrás

A precarização vivida nos últimos anos pelo conjunto do serviço público também atinge o Ministério do Trabalho e Emprego, responsável pelas fiscalizações de combate ao trabalho análogo à escravidão, de forma que operações como a de Bento Gonçalves não dependam de fugas de trabalhadores. A situação no órgão é de grave falta de servidores e servidoras. Conforme o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait), o último concurso foi realizado em 2013, com apenas 100 vagas, que não foram todas preenchidas até agora. Dessa forma, cerca de 40% do quadro está vago, com quase 1.500 vagas em aberto. Ainda conforme o Sinait, a carreira da Auditoria-Fiscal do Trabalho está operando no limite, com menos de 2 mil auditores em atividade, o mesmo quadro de 25 anos atrás. O ministro do Trabalho, Luiz Marinho, em reunião com o Sinait neste mês, disse que está buscando viabilizar a realização de um concurso o quanto antes, se possí­vel ainda neste ano.

Parte do problema é oriundo da emenda constitucional (EC) 95/2016, do teto de gastos, que congela os gastos públicos por vinte anos. Tanto para a contratação de fiscais quanto para outros servidores e servidoras dos demais órgãos públicos, a EC 95 impede o suprimento de cargos vagos, prejudicando a qualidade dos mais diversos serviços públicos dos quais a população necessita, incluindo a fiscalização de direitos trabalhistas. Assim, a revogação da EC 95 é uma necessidade para que o serviço público seja fortalecido e passe a atender às necessidades da sociedade brasileira.

Com informações da CUT/RS, do jornal Pioneiro e do portal G1