SINDICATO DOS TRABALHADORES DO JUDICIÁRIO FEDERAL E MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO - FUNDADO EM 28 DE NOVEMBRO DE 1998 - FILIADO À FENAJUFE E CUT

NA BOLSA? BEM, OBRIGADO

Privada de energia no RS deixa milhões de gaúchos no escuro, mas ações da empresa dobraram de valor na bolsa em cinco anos; veja os deputados que votaram pela privatização da CEEE

Três dias depois do temporal que atingiu parte do Rio Grande do Sul na última terça-feira, mais de 276 mil famí­lias, mais de um milhão de pessoas, continuam no escuro nesta sexta-feira, 19, a maior parte delas em Porto Alegre e na Região Metropolitana. A CEEE Equatorial, empresa privada responsável por parte da área, já fala que os problemas continuam pelo menos até domingo. A causa da demora, que gera prejuí­zo também para pequenos e médios negócios, não é mais o mau tempo, mas a lógica de busca pelo lucro que conduz a polí­tica de uma empresa privada, mesmo em um setor essencial para a população.

No final da tarde de quinta-feira, 18, 62 unidades de saúde de Porto Alegre continuavam sem energia elétrica. Nos últimos dois dias, hospitais e dezenas de outras unidades também foram afetadas, assim como escolas. Comerciantes têm de manter seus negócios fechados e muitos perdem produtos que precisariam estar refrigerados. Além das famí­lias, que veem comida estragar nas geladeiras e têm seu cotidiano diretamente afetado, inclusive no cuidado com doentes. Há falta de água em boa parte da capital gaúcha por conta das dificuldades causadas pela falta de energia elétrica nas estações. Entre quarta e quinta, pelo menos 25 protestos aconteceram nas ruas de Porto Alegre por conta da falta de energia e de água. Os protestos continuam ao longo desta sexta.

Responsáveis: Melo e outros 39 deputados que votaram a favor da privatização da CEEE em 2019

A privatização da CEEEtransformada, então, em CEEE Equatorialfoi aprovada pela Assembleia Legislativa do RS, em uma vitória do governador Eduardo Leite (PSDB), em julho de 2019. O atual prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB), foi um dos 40 deputados que votou a favor da proposta (foram 14 votos contrários). Melo, numa tentativa de repassar a responsabilidade, chegou a reclamar da Equatorial nas redes sociais alegando que “não era atendido”.

Votaram a favor da privatização os seguintes parlamentares:

Aloí­sio Classmann (PTB)
Dirceu Franciscon (PTB)
Elizandro Sabino (PTB)
Kelly Moraes (PTB)
Dr. Thiago Duarte (DEM)
Eric Lins (DEM)
Rodrigo Lorenzoni (DEM)
Adolfo Brito (PP)
Ernani Polo (PP)
Frederico Antunes (PP)
Issur Koch (PP)
Sérgio Turra (PP)
Silvana Covatti (PP)
Neri o Carteiro (Solidariedade)
Capitão Macedo (PSL)
Tenente Coronel Zucco (PSL)
Vilmar Lourenço (PSL)
Fran Somensi (PRB)
Sergio Peres (PRB)
Gaúcho da Geral (PSD)
Carlos Búrigo (MDB)
Edson Brum (MDB)
Fábio Branco (MDB)
Gabriel Souza (MDB)
Gilberto Capoani (MDB)
Sebastião Melo (MDB)
Tiago Simon (MDB)
Vilmar Zanchin (MDB)
Luiz Henrique Viana (PSDB)
Mateus Wesp (PSDB)
Pedro Pereira (PSDB)
Zilá Breitenbach (PSDB)
Dalciso Oliveira (PSB)
Elton Weber (PSB)
Franciane Bayer (PSB)
Fábio Ostermann (NOVO)
Giuseppe Riesgo (NOVO)
Airton Lima (PL)
Paparico Bacchi (PL)
Any Ortiz (PPS)

Equatorial reduziu quase metade quadro de pessoal, mas valor na bolsa mais do que dobrou em cinco anos

O leilão que vendeu a CEEE à Equatorial aconteceu em março de 2021, com o valor de apenas R$ 100 mil. Logo a seguir, a empresa deu iní­cio a uma onda de demissões que levou embora quase metade do quadro de funcionários. Dos cerca de 2,5 mil funcionários, 998 aderiram ao plano de demissões voluntárias (PDV) lançado pela Equatorial, e a empresa demitiu outros tantos. Conforme o presidente do Sindicato dos Eletricitários do Rio Grande do Sul (Senergisul), Antonio Silveira, há muita precarização e hoje mais de 90% das atividades da Equatorial são terceirizadas , apontou. Segundo Antônio, é mão de obra barata, com pouca qualificação técnica e, desta forma, não conseguem atender qualquer evento fora da normalidade, além da precariedade da manutenção de suas instalações, que refletem negativamente no seu desempenho operacional .

A demissão de quase metade do quadro funcional gera problemas para a prestação dos serviços, como a demora na religação após quedas de energia. Mas a saúde financeira da empresa vai muito bem. Desde 2019, o valor das ações da Equatorial mais do que dobrou, mesmo com os sucessivos problemas não apenas no Rio Grande do Sul, mas também nos outros estados onde opera. No final do ano passado, a Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul (Agergs) aplicou uma multa de R$ 24,3 milhões à CEEE Equatorial devido à baixa qualidade de serviços prestados pela empresa, que atende cerca de 1,8 milhão de gaúchos e gaúchas em 72 municí­pios das regiões Metropolitana de Porto Alegre, Sul, Centro-Sul, Campanha, Litoral Norte e Litoral Sul.

A Equatorial teve lucro lí­quido consolidado de R$ 927,7 milhões no terceiro trimestre do ano passado, o que corresponde a alta de 58,7% em relação aos R$ 584,5 milhões de um ano antes. A receita lí­quida da companhia somou R$ 10,36 bilhões, aumento de 50,6% na comparação anual.

Trocar de empresa não resolve, é preciso trocar a lógica

O tipo de problema que a população gaúcha enfrenta não é exclusividade do estado. Em outros locais, onde empresas diferentes operam de forma privada o setor de energia, os problemas são semelhantes. Em São Paulo, por exemplo, dezenas de milhares de pessoas passaram muitas horas sem energia cerca de uma semana atrás, após um temporal. Lá, a responsabilidade é da Enel, que adquiriu a Eletropaulo em 2018. Em dezembro do ano passado, o relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Enel da Assembleia Legislativa de SP apontou irregularidades e negligências cometidas pela concessionária entre 2018 e 2023. O relatório diz que, além de negligente, a empresa concessionária foi ineficiente na prestação dos serviços, principalmente depois do apagão de 3 de novembro. Na ocasião, alguns bairros chegaram a ficar mais de quatro dias sem luz.

A lógica é a mesma: manter a lucratividade a todo custo. Mesmo que esse custo seja um direito básico da população. Assim, para garantir esse direito, uma empresa de um setor importante como esse não poderia ser privatizada; precisaria ter o bem público como único objetivo, não o lucro. Dessa forma, trocar a Equatorial por outra empresa privada não vai resolver o problema da população do Rio Grande do Sul. É preciso reestatizar e investir na CEEE, bem como na Corsan, privatizada no mesmo pacote.

Movimento sindical e comunidade organizam ato em defesa da luz e água públicas

Na manhã desta sexta-feira, a Frente dos Servidores Públicos do RS, da qual o Sintrajufe/RS faz parte, reuniu-se para discutir a crise, com a presença das centrais sindicais (CUT, CTB e Intersindical). As entidades avaliaram que a responsabilidade é de Eduardo Leite e Sebastião Melo, já que os problemas enfrentados nos últimos dias são frutos da privatização da CEEE, da falta de investimentos e do desmonte da rede de atendimento feito pela atual proprietária, a Equatorial Energia. Eduardo Leite vendeu a CEEE por R$ 100 mil e Melo, deputado estadual à época, votou a favor da venda. Ambos seguem defendendo a privatização. Assim, na próxima quarta-feira, 24, às 18h, será realizado um ato público pela reestatização da CEEE e contra a privatização do DMAE, pretendida por Melo. A concentração será em frente ao Piratini, com caminhada até o Paço Municipal, em defesa da luz e da água públicas. Serão organizados ônibus para que as diferentes comunidades participem da manifestação.

Com informações do Brasil de Fato, GZH, CUT e Agência Brasil