Na tarde de segunda-feira, 18, Jair Bolsonaro (PL) voltou à carga em sua série de ameaças ao processo eleitoral marcado para outubro. Dessa vez, as mentiras e ataques foram desferidos para um público de algumas dezenas de diplomatas estrangeiros. A pretexto de denunciar as “vulnerabilidades” da urna eletrônica, o presidente insiste em atacar o resultado do trabalho sério de milhares de servidores e servidoras da Justiça Eleitoral sem apresentar nenhuma prova de fraude que alega existir. Suas acusações se assemelham ao movimento alimentado por Donald Trump, que em janeiro de 2021 incitou apoiadores a invadir o Capitólio, sede do congresso norte-americano.
Notícias Relacionadas
Mentiras já desmascaradas
No início do encontro, Bolsonaro disse que basearia a apresentação em um inquérito da Polícia Federal sobre o suposto ataque hacker ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) durante as eleições de 2018. Trata-se do mesmo inquérito apresentado pelo presidente em live em julho de 2021, quando ele apresentou uma série de mentiras e teorias que circulam em redes sociais para desacreditar o sistema eleitoral. As declarações de Bolsonaro sobre a não confiabilidade das urnas têm sido contestadas pelo TSE desde o ano passado. A corte já disse que o inquérito a que o presidente se refere não concluiu que houve fraude no sistema eleitoral em 2018 ou que poderia ter havido adulteração dos resultados, ao contrário do que disse o mandatário.
De acordo com nota do tribunal de agosto do ano passado, o próprio TSE encaminhou à Polícia Federal as informações necessárias à apuração dos fatos e prestou as informações disponíveis. A investigação corre de forma sigilosa e nunca se comunicou ao TSE qualquer elemento indicativo de fraude . O texto disse ainda que o episódio da invasão do hacker, que ocorreu em 2018, foi divulgado à época em veículos de comunicação diversos. Embora objeto de inquérito sigiloso, não se trata de informação nova . O TSE disse que o acesso dos hackers não representou qualquer risco à integridade das eleições de 2018 , porque o código fonte dos programas passa por sucessivas verificações e testes, identificando possíveis manipulações. Nada de anormal ocorreu , disse à época.
Na última semana, o Tribunal de Contas da União (TCU) concluiu a terceira fase de sua auditoria do processo eleitoral e, pela terceira vez, atestou a segurança do processo. Ao todo, foram identificados 15 diferentes tipos de planos de contingência de alcance nacional envolvendo todas as fases do processo eleitoral. A conclusão do TCU foi que o TSE possui planos de contingência adequados para prevenir, detectar, obstruir e neutralizar quaisquer ações adversas à normalidade da eleição, como ataques cibernéticos. O TCU também atestou que os planos estão adequados aos padrões internacionais.
Desrespeito com servidores
Ao colocar em dúvida a integridade do processo eleitoral, Bolsonaro desqualifica também o trabalho dos servidores e servidoras da Justiça Eleitoral. Atualmente, mais de 35 mil pessoas trabalham na Justiça Eleitoral, incluindo magistrados, servidores efetivos, requisitados e comissionados e força de trabalho auxiliar. Conforme dados do relatório Justiça em Números de 2021, relativos ao ano anterior, são 23.499 servidoras e servidores concursados, comprometidos com a segurança dos processos eleitorais e com a lisura das eleições. É a honestidade e a competência desses servidores e servidoras que Bolsonaro coloca em dúvida a cada vez que questiona a seriedade da Justiça Eleitoral.
Reunião foi obra de generais
Em seu discurso aos embaixadores, Bolsonaro chegou a mencionar que, se dependesse dele, as eleições de 2020 não teriam acontecido. Isso porque, segundo ele, os inquéritos para investigar a segurança das urnas não haviam sido concluídos. Essa declaração é mais um sinal claro do que ele pretende para outubro deste ano, o que pode ganhar contornos mais concretos em 7 de setembro.
A escalada de ameaças de Bolsonaro, que agora chegam ao âmbito internacional, está em consonância com ações de setores militares. O Ministério da Defesa, orientado por Bolsonaro, prepara um programa próprio de fiscalização , algo que nunca ocorreu em períodos democráticos no Brasil. As Forças Armadas estão preparando um plano de fiscalização paralela para as eleições em oito etapas, que vão desde a lacração das urnas até a totalização dos votos, passando por testes de autenticidade e integridade das urnas. As tentativas de desacreditar e tutelar as eleições deste ano são estimuladas nas Forças Armadas pelo governo, que vem enfileirando, há meses, declarações que buscam gerar desconfiança sobre as urnas eletrônicascom as quais o próprio Bolsonaro foi eleito em diversas ocasiõese preparar o terreno para questionar as eleições em caso de derrota. Em abril, Bolsonaro deu declarações pedindo uma apuração paralela de votos pelos militares, com um computador próprio. Ele chegou a dizer que os votos eram apurados em uma sala secreta do TSE, o que é mentira.
De acordo com a Revista Fórum, a reunião com os embaixadores foi obra dos generais Augusto Heleno, ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI); Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria-Geral da Presidência; Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira; ex-comandante do Exército que está à frente da Defesa; e Walter Braga Netto, ex-ministro e pré-candidato a vice na chapa que concorre à reeleição. Além deles, diz texto da Revista Fórum, o tenente-coronel Mauro César Barbosa Cid, ajudante de ordens de Bolsonaro, teria organizado o evento. Segundo reportagem da CNN Brasil, relatada pela Fórum, coube ao tenente-coronel a incumbência de preparar a apresentação em Power Point. O militar é filho do general Lorena Cid, que exerce um cargo de confiança no escritório em Miami da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex).
Ação do Sintrajufe/RS aguarda decisão do TRF4; Judiciário está com a palavra
Os ataques de Bolsonaro e suas tentativas de gerar desconfiança sobre as eleições, apontando até mesmo para o não reconhecimento dos resultados e para soluções de força, se repetem pelo menos desde o início do ano passado. Desde lá, alternam-se períodos de aparente calmaria com declarações explosivas que buscam tumultuar o cenário político e o pleito marcado para outubro.
Contra essas declarações, o Sintraufe/RS ingressou, em julho de 2021, com ação judicial pedindo que a Justiça determine que Bolsonaro se abstenha de divulgar ou fomentar conteúdos que sugiram fraudes nas eleições organizadas pela Justiça Eleitoral. Em setembro do mesmo ano, o desembargador Victor Laus, do TRF4, indeferiu o agravo de instrumento com pedido de efeito suspensivo. A ação também foi derrotada em primeira instância, mas o Sintrajufe/RS recorreu e, em 20 de março deste ano, o recurso foi distribuído ao TRF4 para tramitação em segunda instância, sendo o desembargador Victor Laus designado como relator.
Com informações do portal G1, da Folha de S. Paulo e da Revista Fórum.