SINDICATO DOS TRABALHADORES DO JUDICIÁRIO FEDERAL E MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO - FUNDADO EM 28 DE NOVEMBRO DE 1998 - FILIADO À FENAJUFE E CUT

COLEGAS DA ESTADUAL

Gratificação de “selo do CNJ” e tratamento diferenciado; servidores denunciam produtivismo e cobram diálogo e política salarial isonômica e justa

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) está buscando criar uma nova gratificação para os servidores e as servidoras, vinculada ao selo que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) confere às instituições de acordo com, entre outros itens, a produtividade. Os trabalhadores e as trabalhadoras do Judiciário Estadual do RS, organizados no Sindjus/RS, estão mobilizados contra a proposta, que, entre outros problemas, não alcançaria os aposentados e as aposentadas; eles defendem a incorporação ao salário dos recursos que iriam para a gratificação e denunciam que, enquanto juízes e magistrados podem receber reajuste de 18%, para a categoria o índice proposto – e ainda não formalizado – é de apenas 12%. Para tratar do tema, o Sintrajufe/RS entrevistou o dirigente do Sindjus/RS Fabiano Zalazar.

Selo premiado? Gratificação vinculada à produtividade cobre falta de servidores

A Gratificação de Desempenho Institucional (GDI) tramita como processo administrativo (Processo Themis no Órgão Especial nº 0023-23/00000-3-6) e sua votação no Órgão Especial do TJRS está prevista para o dia 8 de maio. Se aprovada, ela será vinculada ao selo concedido pelo CNJ, que, por sua vez, está determinado, entre outros critérios, pela produtividade. O Sindjus/RS denuncia que “as gratificações focam apenas em meritocracia, com índice variável, sem valorizar de fato a dedicação dos servidores”. O sindicato defende que os valores reservados para a GDI sejam redirecionados para melhorar o reajuste salarial da categoria.

Veja abaixo entrevista realizada pelo Sintrajufe/RS com um dos secretários gerais do Sindjus/RS, Fabiano Zalazar:


No último período a categoria vem se mobilizando na campanha salarial e para corrigir injustiças no âmbito do Judiciário Estadual. Quais os passos que têm sido dados nessas mobilizações?

Nos últimos anos, sobretudo na administração anterior do TJRS, os servidores obtiveram alguns avanços importantes como o plano de carreira e a equiparação do valor do auxílio-refeição dos juízes. Mas ainda há muito por lutar para corrigir as injustiças dentro de casa e no serviço público de um modo geral. Nossa situação é cada vez mais difícil, com perdas salariais crescentes pela não reposição inflacionária fruto das políticas neoliberais. Nos últimos nove anos, recebemos apenas 6% a título de revisão geral, ano passado, com a inflação pelo IPCA que já ultrapassa 63% no período. Quem mais sofre nesse contexto são nossos aposentados, que não usufruem de benefícios exclusivos de ativos, como as progressões e promoções do PCCs e o auxílio-refeição, entre outros. Esses colegas foram os principais atingidos pela reforma da Previdência do governo Leite, que aplicou a “reforma” de Bolsonaro e aumentou as alíquotas da previdência dos servidores entre 7,5% e 22% em 2020. Portanto, nosso olhar prioritário neste momento é o aumento remuneratório nos salários, o que repercute para ativos e inativos. Nossas mobilizações têm tido esse foco. Estamos em estado de greve desde o dia 13 de março por conta da pauta remuneratória e compromissos não cumpridos pelo TJ, como a mesa de negociação permanente para tratar da pauta salarial. Para nossa surpresa, a Presidência do TJ recentemente considerou “inconstitucional” esse instrumento importante de diálogo com o sindicato. Mas seguimos resistindo e lutando bastante nessa conjuntura com muitas atividades ainda neste mês e em maio, como assembleia geral da categoria já designada, atos de rua e paralisações Seguimos mobilizados tanto na categoria como na Frente dos Servidores, junto com o Sintrajufe, e em outros coletivos de que participamos. Nossa luta se dá nas ruas, no parlamento e no próprio Tribunal de Justiça, buscando ainda o diálogo com a administração, com uma base técnica também que nos assessora e é importante para que tenhamos valorização efetiva como merecemos.

Foto: Divulgação


Como o sindicato e a categoria veem a diferença de tratamento entre juízes e servidores?

São dois pesos e duas medidas nas demandas da magistratura e dos servidores, isso é público e notório, e inclusive tem origem no próprio CNJ, que tem um olhar diferente para requerimentos semelhantes desses dois segmentos dos trabalhadores do Judiciário. Temos o maior respeito pela magistratura e sabemos da sua importância para a manutenção da democracia e do estado de Direito em meio aos ataques do neofascismo. Porém, essa diferenciação de tratamento fica ainda mais evidente quando são arguidas dificuldades orçamentárias, fiscais, limitações legais e políticas para nós que não vemos quanto às demandas da magistratura. Neste momento, por exemplo, tramita na Assembleia Legislativa um projeto de lei de aumento remuneratório para os juízes de 18% em três parcelas, enquanto que para os servidores há a possibilidade de remessa, sabe-se lá quando, de projeto contemplando um índice menor, 12%, em duas parcelas. Isso que os magistrados tiveram um reajuste nos seus subsídios, em 2019, de 16,38%. De outro lado, o Poder Executivo não abriu mesa de negociação com as entidades dos servidores estaduais para tratar da revisão geral anual da inflação, que também nos contemplaria, anunciando-se que não haverá índice para este ano. Todavia, para as cúpulas, a situação é distinta, pois o governador Eduardo Leite sancionou leis em janeiro deste ano que reajustaram o seu subsídio, do vice, dos secretários e dos deputados em índices de 16% a 47%. Onde está a coerência e a crise nesses casos? Não somos absolutamente contrários ao aumento de qualquer categoria profissional. Mas, voltando ao Judiciário: nosso orçamento é um só e temos o dever de disputar esses recursos na defesa da nossa classe. Veja bem, para um técnico judiciário A1 que tem hoje um salário básico inicial de R$ 4,1 mil no TJRS e para nossos aposentados que passam por uma situação maior de empobrecimento e superendividamento, muitos com menos de um salário mínimo sobrando ao final do mês, os índices ofertados e parcelados se tornam cada vez mais insuficientes. Além de serem extremamente injustos do ponto de vista da distribuição dos recursos. Se para um juiz o índice proposto pelo TJRS é de 18%, por que para esse servidor que tem perdas salariais muito superiores e ganha muitíssimo menos o índice é de somente de 12%? Portanto, nossa luta aqui no TJ é por isonomia salarial e valorização profissional, sendo essa a realidade do serviço público como um todo atualmente, sejam servidores federais, estaduais ou municipais. Aliás, é a luta de classes na sua essência, esfera pública e privada, e temos de fazer esse enfrentamento do capital x trabalho unificando nossas pautas. Só assim poderemos sair vitoriosos desse processo.

Qual é, atualmente, a composição da categoria, sua divisão entre concursados e CCs?

Segundo dados do Portal da Transparência do TJRS, temos hoje 6.576 servidores efetivos ativos no nosso quadro, com um total de 2.066 cargos vagos. São 1.339 cargos comissionados ocupados e 204 CCs vagos atualmente no TJRS. Ocupando esses cargos comissionados há hoje 389 servidores efetivos do nosso quadro. A Lei Estadual n° 11.291/98 prevê que no mínimo 20% dos cargos comissionados do TJRS devam ser ocupados por servidores efetivos. Quer dizer que 80% dos cargos podem ser ocupados por pessoas de fora do quadro, sem concurso público.

Portanto, ao menos nesse aspecto, o número não está longe do ideal. É importante dizer que esses cargos comissionados dos assessores dos juízes trabalham muito, não tem dia, não tem hora e não tem noite para eles, sendo também muito explorados do ponto de vista da superestrutura. No entanto, nessa proposta apresentada, o TJRS pretende reajustar os vencimentos dos comissionados do primeiro grau em índices que variam de 19,8% a 38%, em parcela única, nivelando os salários em R$ 7.500,00. A justificativa do TJ é aproximar esses vencimentos com os assessores dos desembargadores, que recebem hoje um básico de R$ 14.843,26. Ora, por que não se aumenta também então o salário do técnico para aproximá-lo com o do analista, o salário do auxiliar de serviços gerais com o do técnico, e daí por diante? Temos inúmeros casos de cargos específicos do quadro em que os servidores exercem a mesma atividade que o seu colega do lado ganhando muito menos. Isso é matéria de ações judiciais de desvio de função, inclusive. Mas o TJ procura corrigir o que denomina de uma injustiça entre os assessores do primeiro e do segundo grau olhando apenas para um lado da moeda. O que ocorre no final das contas é que essa política do TJ de remuneração diferenciada dos cargos e funções nos divide enquanto classe. Essa divisão traz um enorme prejuízo para a unidade e a mobilização da classe trabalhadora, pois uma mesma proposta, um projeto de lei, pode ter graves distorções. Lembro que há alguns anos o TJ propôs em um mesmo projeto de lei, depois aprovado, a extinção de dois cargos (oficial ajudante e auxiliar de serviços gerais) e o reajuste de 6% para os cargos comissionados de assessor de juiz e a função gratificada de secretário de juiz e pretor, ocupado por oficiais escreventes. O resultado foi a divisão da categoria. É necessário que as categorias avaliem com muito cuidado esse fatiamento de propostas distintas em um mesmo projeto de lei. O que deve nos unir é a luta por aumento salarial efetivo no nosso vencimento básico, aquilo que contempla os aposentados e os ativos, e é o que levaremos efetivamente para a aposentadoria.

Por que a ideia do Tribunal de Justiça de criar uma gratificação vinculada ao selo do CNJ gera preocupação? Que efeitos a possível concretização disso poderá gerar para a categoria como um todo e para segmentos como os aposentados e aposentadas?

O TJ deseja criar uma verba que tem uma repercussão financeira de R$ 24 milhões no primeiro ano. Ela visa aferir o desempenho dos servidores com base nesse selo do CNJ com um valor fixo sobre o cargo de técnico judiciário A1. O percentual dessa gratificação variaria conforme a premiação concedida pelo Prêmio CNJ de Qualidade. Pela proposta do TJ, pelo selo Prata em 5%, R$ 229,88; Ouro, 7,5%, R$ 344,82; e Diamante, 8%, R$ 367,81. O valor pode ser considerado baixo, mas é a porta aberta para uma política que na ponta incentiva ainda mais o assédio e o produtivismo ao invés de garantir condições de trabalho para todos. Além disso, tal “premiação” não será incorporada nos vencimentos dos servidores, pois não temos mais esse direito, e os aposentados também não irão perceber essa verba, mais uma vez sendo alijados. No avançar dos anos, com apenas ativos ganhando a GDI, o fosso remuneratório aumentará cada vez mais entre aposentados e ativos, o que é preocupante. Ainda, no nosso entendimento, essa proposta é claramente inconstitucional, vez que deveria ser estendida também aos aposentados. Se ela vier a ser aprovada no Órgão Especial e o projeto de lei for sancionado, no dia seguinte o Sindjus/RS ingressará com ação judicial para estender os seus efeitos aos aposentados. Por isso a atual administração do TJ errou ao não dialogar com as entidades, que têm acúmulo e experiência desde a comissão que foi responsável pela criação do plano de carreira, uma grande conquista, mas que precisa ser aprimorado através da mesa de negociação e construção. Poderíamos ter contribuído muito nesse processo em curso de revisão às avessas do plano de carreira. A história mostra que os grandes erros da humanidade acontecem por falta de diálogo, e, nesse caso, transparência nas ações. Mas como disse, vamos resistir até o último minuto para mudar essa proposta, pois do jeito que foi concebida não é possível aceitar.

A vinculação de uma gratificação ao selo do CNJ pode melhorar a prestação jurisdicional? A população ganha algo com essa proposta?

De modo algum. É um grande erro, no nosso entendimento, que inclusive deve preocupar outras categorias do serviço público se for implementada por aqui. Obviamente que não vai melhorar a prestação jurisdicional, pois a melhoria dos serviços deve se dar com uma política clara, do ponto de vista da gestão e da remuneração dos trabalhadores, sem penduricalhos, para começar, cobrando o servidor sim, mas sem açoite, como na implantação de metas inatingíveis e o assédio moral que tem nos levado ao aumento do adoecimento laboral. Deve-se qualificar o servidor com cursos de capacitação, com a formação humana e intelectual com planos de carreira que visem ao nosso desenvolvimento profissional, o que reverte automaticamente na melhoria da prestação dos serviços para a população. Isso sim é uma política séria e de vanguarda que beneficia toda sociedade. Essa proposta da GDI é meritocrática e produtivista e, no nosso entendimento, não atende aos princípios constitucionais da administração pública da moralidade, da legalidade e da eficiência. Ela não tem nada de vanguardista, significando até mesmo um retrocesso do ponto de vista da gestão. Aqui no TJ somos há anos selo Ouro e Diamante, figurando nas primeiras colocações no ranking do CNJ. Precisamos de uma outra premiação para produzir mais? E amanhã ou depois, quem garante que até mesmo magistrados não criarão verba semelhante, a exemplo da gratificação de acervo instituída no TJ? Precisamos urgentemente debater uma política salarial séria, até mesmo para os magistrados, cessando de uma vez por todas com as gratificações e demais penduricalhos desnecessários, levando esse debate ao parlamento e ao Poder Executivo para que analise com seriedade a questão da recuperação do poder de compra dos trabalhadores e a revisão geral anual da inflação nos nossos vencimentos, como determina a Constituição Federal, bem como a data-base das categorias. Não é possível prosseguirmos com tanto arrocho e exploração. Ao final, quem mais perde com tudo isso é igualmente a própria população, com o gradual desmonte e a precarização dos serviços públicos.