SINDICATO DOS TRABALHADORES DO JUDICIÁRIO FEDERAL E MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO - FUNDADO EM 28 DE NOVEMBRO DE 1998 - FILIADO À FENAJUFE E CUT

QUEM ESTá PERGUNTANDO?

TJ-RS restringe acesso a salários de magistrados; CNJ disse que irá intimar o tribunal

O Tribunal de Justiça do RS (TJ-RS) determinou que, para obter informações sobre proventos de juí­zes, desembargadores ou servidores e servidoras do órgão, o cidadão ou cidadã deve informar à corte seu nome e número de documento. A medida é irregular, pois o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) estabeleceu regramento, desde 2021, para que informações individuais e nominais de remuneração no Judiciário sejam automaticamente disponibilizadas para divulgação ampla aos cidadãos , em substituição a uma norma que permitia a coleta de informações pessoais de quem fazia a consulta.

A assessoria de imprensa do CNJ confirmou ao Matinal Jornalismo que a situação é irregular. A informação é que a denúncia seria incluí­da em um processo que acompanha se os tribunais estão cumprindo as determinações e o TJ-RS seria intimado sobre a limitação ao acesso à informação, já que a resolução não prevê a exigência de identificação ao usuário .

Esse tipo de medida representa uma restrição à fiscalização das remunerações de magistrados e traz riscos às pessoas que usam o portal de transparência do tribunal, segundo entidades consultadas pela Matinal. Temos um histórico de situações em que, quando alguém consultava o salário de alguém e essa informação ia para o sistema, isso levava a algum tipo de retaliação , diz a jornalista Kátia Brembatti, presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), entidade que preside o Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas.

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Em 2013, uma servidora do Senado Federal acabou condenada pela Justiça após usar os dados pessoais coletados pelo portal de transparência da Casa para ver quem consultou seu salário e tentar intimidar uma pessoa que buscou a informação. A funcionária mandou e-mails para o cidadão e o chamou de bisbilhoteiro e fofoqueiro .

O pedido de identificação só está ali [na página do TJ] para desincentivar o cidadão comum no acesso à informação, que fica com receio e medo de carteiraço , disse à Matinal um porta-voz da agência de transparência de dados públicos Fiquem Sabendo. Justamente por isso não podemos ter esse tipo de exigência.

Um levantamento recente do jornal O Globo apontou que o tribunal gaúcho e o de Rondônia lideram a lista de maiores salários pagos pelo Judiciário a magistrados e magistradas no paí­s em 2023. Somente neste ano, 38 juí­zes e desembargadores receberam um total aproximado de R$ 12 milhões no Rio Grande do Sul. Das dez maiores remunerações pagas no semestre, quatro são para magistrados gaúchos, destacou a GZH.

TJ distorce normas de transparência

Em nota à Matinal, o TJ-RS defendeu a coleta irregular de dados pessoais como condição para a divulgação das remunerações de magistrados, magistradas, servidores e servidoras do Judiciário gaúcho. O Tribunal de Justiça do RS entende que a mera solicitação de identificação do solicitante da informação não obstrui ou dificulta o acesso às informações e, portanto, não afasta a divulgação ampla aos cidadãos e controle dos órgãos competentes, exigida no dispositivo normativo (do CNJ) , disse em nota.

Na avaliação do tribunal, a exigência apenas harmoniza os princí­pios ressaltados pela Lei de Acesso à Informação (LAI) e pela Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) , interpretação que foi considerada equivocada pelos especialistas consultados pela reportagem, já que nem a divulgação de salários deveria estar sujeita à LAI, nem as informações públicas de magistrados e servidores à LGPD.

Conforme especialistas consultados pela Matinal, a corte estaria confundindo informações de transparência ativa, que não devem ter nenhuma restrição de acesso e são sujeitas à disponibilização proativa por órgãos públicos, com as de transparência passiva, em que cabem solicitação e pedido do cidadão e da cidadã, por demandarem tempo e trabalho para organização das respostas à demanda.

A LAI diz que se eu entrar com um pedido de informação de algo que o governo não expõe de forma clara, como quantos magistrados têm valores retidos de pensão, por exemplo, aí­ preciso formalizar e dar minhas informações , explica Brembatti. Mas para entrar em um portal e consultar algo de transparência ativa, em que é preciso manter aquilo público, como salários de servidores ou licitações, não há motivo para essa regra (de informar dados pessoais).

A Fiquem Sabendo ressaltou que a LGPD aponta que dados pessoais só podem ser coletados se eles forem necessários à polí­tica pública, se a coleta não implicar em discriminação ao titular deles (como eventuais retaliações) e se houver transparência quanto ao tratamento dessas informações. Essa ˜proteção™ sequer é efetiva porque quem acessa esses dados (de remuneração) para fins de fraude não iria fazê-lo de forma identificada , disse o porta-voz da agência. A barreira só está ali para desincentivar que o cidadão comum acesse essas informações.

Fonte: Matinal Jornalismo