As mortes violentas no Brasil chegaram ao patamar mais baixo em 12 anos, segundo dados do 17º Anuário Brasileiro de Segurança Pública. A queda manteve uma tendência verificada desde 2018. Foram 47.508 vidas perdidas no conjunto que reúne os crimes de homicídios dolosos, latrocínios, lesão corporal seguida de morte e mortes por intervenção policial. Uma a cada cinco mortes violentas intencionais no Brasil no ano passado aconteceram nos nove estados da Amazônia Legal. O índice é o mais alto do país, mesmo que a região responda por apenas 13,6% da população brasileira, de acordo com o Censo 2022.
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Entre 2020 e 2021, os números de mortes violentas no país caíram 4%; em 2022, a redução foi de 1,9%. As mortes por intervenção de agentes policiais chegaram a 6.430, com redução de 1,4%.
A taxa proporcional de mortes a cada 100 mil habitantes no Brasil diminuiu de 24 para 23,4; o país tem 2,7% da população global, mas concentra cerca de um quinto dos homicídios no mundo, segundo dados de 2020 do Escritório das Nações Unidas para Crimes e Drogas.
A taxa de homicídios dolososindicador que concentra a maior parte das mortes violentas intencionaisficou em 19,5, com queda de 2,2% entre 2021 e 2022. No 16ª anuário, o Brasil era o oitavo país com mais mortes violentas por 100 mil habitantes do mundo. A edição atual não tem dados atualizados e cita que o país ainda não incluiu informações sobre 2021 e 2022 no banco da ONU.
As informações são colhidas nas secretarias de Segurança Pública e órgãos correlatos nos estados. Para os cálculos de população, são usadas estimativas e o número indicado em 2022 pela edição mais atualizada do Censo Demográfico.
Entre os crimes que compõem o indicador de mortes violentas intencionais, o único que registrou aumento no país foi o de lesão corporal seguida de morte, que passou de 517 casos em 2021 a 610 no ano passado.
Novo arranjo na segurança pública
Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que organiza o anuário, a explicação para a queda de mortes violentas no Brasil encontra alguns paralelos fora do país, como o envelhecimento da população, mas a análise se divide em várias hipóteses para a redução.
Um dos principais questionamentos é sobre a ampliação do acesso a armas no governo de Jair Bolsonaro (PL), que creditou a queda de homicídios ao aumento do armamento e a repasses de recursos a estados por meio do Ministério da Justiça. O presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima, afasta a tese e diz que não há, no Brasil, uma política nacional de segurança pública. Para ele, se as mensagens de Bolsonaro tivessem ganhado tração como política nacional, os homicídios teriam aumentado.
O Fórum tem defendido que a flexibilização de armas, inclusive, impediu uma queda maior dos assassinatos no país. Em 2022, três em cada quatro assassinatos no país foram cometidos com arma de fogo.
Governos, segundo Lima, não podem pensar somente em financiamento e estrutura e gestão da atividade policial. “Gestão de segurança pública é articulação. Ao longo dos anos, muito dinheiro foi investido . No entanto, ele pondera que “não adianta só dar dinheiro a estados e municípios sem uma coordenação, um rearranjo federativo”.
Ele considera que os dados evidenciam a necessidade desse novo arranjo. “Quando olhamos chamados do 190, vemos que, basicamente, as Polícias Militares estão sendo despachadas para casos de violência contra mulher. Precisam estar preparadas para isso.”
Parte dos esforços políticos também deverão se concentrar nas 9.479 ocorrências de mortes em 2022 que ainda precisam ser esclarecidas. “Boa parte dessas mortes pode ser de homicídios, mas é importante ter secretarias analisando questões para além das corporações, que fazem perícia, investigação e análise jurídica.”
Outra hipótese para a redução de mortes é a migração do crime. Os números de roubos de cargas, em casas e em estabelecimentos comerciais caíram, enquanto 208 golpes de estelionato foram aplicados a cada hora no país em 2022. O total chegou a 1,8 milhão de casos. Isso indica, segundo Lima, que quadrilhas estão preferindo modalidades com menos riscos e mais ganhos.
Amazônia Legal
Uma das razões que também pode contribuir para a redução de mortes é a dinâmica do crime organizado. A Amazônia se tornou um campo de disputa, com aumento da violência nos últimos anos em regiões como Norte e Nordeste. Isso porque facções como o PCC (Primeiro Comando da Capital) e o CV (Comando Vermelho) buscam expandir seus ciclos de domínio de produção e escoamento de drogas, com um rompimento agravado entre 2016 e 2017 e consequência nas mortes.
“É um cenário para facções de crime organizado, principalmente as de base prisional, mas também milícias, grupos de extermínio e por diante. Com o PCC dominando a principal rota de cocaína, o CV foi encontrar em Tabatinga [AM], em parceria com a Família do Norte, a segunda principal rota do país”, afirma Lima.
Com as respostas dos estados do Nordeste apresentando reduções nas mortes violentas, o foco se volta para a Amazônia como principal região em disputa no país. A Amazônia Legal, que havia registrado aumento em homicídios na edição anterior da publicação, concentrou, no ano passado, uma em cada cinco mortes violentas intencionais.
O estado mais violento do país é o Amapá, com uma taxa de 50,6 mortes violentas intencionais a cada 100 mil habitantes, mais que o dobro da nacional, de 23,4 mortes.
A região Norte, no entanto, apresentou redução de 2,7% no indicador. Ela fica atrás do Nordeste, que viu as mortes violentas caírem 4,5% em um ano. O Sudeste teve queda de 2%, com São Paulo mantendo a menor taxa do país: 8,4 mortes a cada 100 mil habitantes. Sul e Centro-Oeste tiveram, respectivamente, aumentos de 3,4% e 0,8% nas mortes.
Fonte: Folha de S. Paulo