SINDICATO DOS TRABALHADORES DO JUDICIÁRIO FEDERAL E MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO - FUNDADO EM 28 DE NOVEMBRO DE 1998 - FILIADO À FENAJUFE E CUT

PERSEGUIÇÃO

Iremos matar você : parlamentares que se solidarizaram a vereadora catarinense cassada recebem ameaças

No mesmo dia em que foi cassada pela Câmara Municipal de São Miguel do Oeste (SC), no sábado, 4, por denunciar um gesto nazista feito por dezenas de bolsonaristas em frente à base do Exército da cidade, em novembro do ano passado, a vereadora Maria Tereza Capra (PT) foi ameaçada de morte em mensagem enviada por e-mail. A mensagem dizia Vou cassar sua vida e afirmava que a cassação de seu mandato era só o primeiro passo.

Outras duas vereadoras também foram ameaçadas de morte e ví­timas de racismo. Ana Lúcia Martins (PT), de Joinville, que defendeu Maria Tereza nas redes, foi ví­tima de insultos racistas. Foi chamada de macaca imunda . O agressor também disse que ela deveria morrer porque é uma mulher negra e, em seu lugar, deveria assumir um homem branco. A vereadora Giovana Mondardo (PCdoB), de Criciúma, também recebeu mensagens com ameaças de morte.

Gaúcha de Canoas, professora e advogada, no exercí­cio do terceiro mandato, Maria Tereza Capra havia repudiado o gesto nazista feito por bolsonaristas golpistas durante a execução do hino nacional no dia 2 de novembro, em frente ao quartel do Exército do municí­pio catarinense, alguns dias após o segundo turno das eleições vencidas nas urnas pelo presidente Lula (PT). O relatório da Comissão de Inquérito Parlamentar, instalada na Câmara, acusou a vereadora de ter feito uma postagem no Instagram para propagar notí­cias falsas e atribuir aos cidadãos de Santa Catarina e ao Municí­pio de São Miguel do Oeste o crime de fazer saudação nazista e ser berço de célula neonazista

Em sessão extraordinária, que durou mais de nove horas e encerrou após as 3h da madrugada do último sábado, 4, a Câmara Municipal de São Miguel do Oeste (SC) cassou por 10 votos a 1 o mandato da vereadora por quebra de decoro parlamentar. Votaram a favor da cassação os vereadores Carlos Agostini (MDB), Elói Bortolotti (PSD), Gilmar Baldissera (PP), Moacir Fiorini (MDB), Nélvio Paludo (PSD), Paulo Drumm (PSD), Ravier Centenaro (PSD), Valnir Scharnoski (PL), Vilmar Bonora (PSD) e Vanirto Conrad (PDT). Somente Maria Tereza votou contra e Cris Zanatta (PSDB) não participou da sessão, que foi presidida por Vagner Passos (sem partido), que votaria somente em caso de empate.

A defesa

Na sustentação oral da defesa, iniciada já após as 23h da sexta-feira, 3, a vereadora agradeceu o apoio de seu partido, com dezenas de militantes presentes à sessão, e falou das ameaças que recebeu desde novembro, especialmente pelas redes sociais. Ela frisou ainda as dificuldades que uma mulher enfrenta ao entrar na polí­tica, como a dupla jornada e a criação dos filhos, lamentando que não foi ela quem divulgou o ví­deo que viralizou, e sim pessoas que estavam nos atos golpistas. A vereadora disse que é no parlamento onde é possí­vel equilibrar um pouco as forças; que estão aqui 11 homens, uma vereadora está ausente, e uma vereadora que vai ser cassada. Isso é representatividade? , questionou. Ela afirmou que a luta pela representatividade da mulher irá continuar, com ou sem ela, e apelou dizendo que os vereadores poderiam fazer história ao pedir que os eles votassem contra o relatório.

O advogado Sérgio Graziano falou também em defesa da vereadora. Ele ressaltou que o processo é de perseguição polí­tica, que não há qualquer fato jurí­dico, polí­tico ou social que justifique o pedido de cassação, afirmando que, em seus 31 anos de advocacia, em todas as suas defesas, jamais viu tamanha injustiça. Graziano disse que compreende a indignação de parte da população ao ver o ví­deo, em que a vereadora repudia um gesto, comparando-o ao gesto feito no nazismo, que representa o que de pior há na história da humanidade. Ele afirmou que no ví­deo Maria Tereza não ofendeu nenhuma pessoa, não citou nenhuma pessoa, não fez nenhum movimento judicial para criminalizar qualquer um que estava naquelas manifestações. Não é comum ouvir o Hino Nacional com a mão estendida daquela forma. Nem a força militar faz isso , ressaltou o advogado. Quando a Maria Tereza Capra faz esse ví­deo, já estava em curso a investigação promovida pelo Ministério Público (MP), para saber se ali existia ou não um crime de incitação ao ódio, ou crime de atos antidemocráticos , relembrou.

O advogado citou moção de apelo aprovada nesta semana na Câmara, pedindo a veí­culos de imprensa que divulgassem o resultado da investigação do MP. Ele afirmou que na moção os próprios vereadores entendem que não foi a partir do ví­deo de Maria Tereza que São Miguel do Oeste ficou conhecida como terra de nazistas , salientando que o ví­deo foi divulgado inclusive pela imprensa nacional. Os senhores reconhecem que não foi Maria Tereza Capra quem fez a divulgação , enfatizou. Graziano disse que, com gesto do braço estendido, o mundo e até a imprensa local entenderam como um gesto nazista. Esses gestos, pelo seu simbolismo e representação histórica devem ser evitados , afirmou. Ele disse que não se pode responsabilizar Maria Tereza por ter visto um gesto nazista naquela manifestação, quando todos interpretaram dessa forma até que houvesse a explicação por parte dos bolsonaristas. Ao final, Graziano alertou que a cassação da vereadora macularia a imagem da Câmara, ao usar o verniz da legalidade para encobrir uma perseguição polí­tica. Se essa Câmara tiver consciência, ela pode sair muito maior do que começou essa sessão de hoje , afirmou. Ele pediu o arquivamento da denúncia e, se não fosse possí­vel, que a pena deveria ser a de advertência.


Vereadoras de Joinville, Florianópolis, Criciúma, Brusque e São Miguel do Oeste receberam ameaças

Na última sexta-feira, 3, também foram enviadas ameaças à vereadora Carla Ayres (PT), de Florianópolis, em uma escalada de violência polí­tica em Santa Catarina. O mesmo ocorreu com vereadores de outras cidades catarinenses nos últimos dias: além de Carla e Maria Tereza, Marlina Oliveira (PT), de Brusque, e Giovana Mondardo (PCdoB), de Criciúma, também foram ameaçadas. Todas elas haviam se manifestado em defesa da vereadora cassada de São Miguel do Oeste. As ameaças foram feitas por e-mail.

Para Ana Lúcia e Marlina, além da ameaça de morte, as ofensas foram racistas. Já para Carla, o conteúdo tinha ofensas lesbofóbicas. Maria Tereza, que é citada em ambos os e-mails, sofre ameaças de morte desde que denunciou a suspeita de gesto nazista. Giovana foi chamada de comunista e recebeu insultos. A vitória final virá e iremos matar você , Seus dias e os dados sua famí­lia estão contados , diziam os e-mails.

Foram registrados boletins de ocorrência frente às ameaças. Nessa quarta-feira, 8, as vereadoras ameaçadas participaram de um ato de solidariedade na Câmara Municipal de Florianópolis. As parlamentares levaram um cartaz com os dizeres: Eles combinaram de nos matar, nos combinamos de não morrer! .

Com informações da CUT e do portal G1