Cláudio Mor
O jornal Folha de S. Paulo publicou matéria, no último sábado, 13, denunciando tentativa de censura por parte de uma entidade representativa de oficiais da Polícia Militar de São Paulo. A própria Folha e os cartunistas Laerte, João Montanaro, Alberto Benett e Claudio Mor estão sendo interpelados judicialmente por conta de cinco charges publicadas em 2019 e que denunciavam práticas de violência policial. As charges foram publicadas na sequência da ação da polícia na favela de Paraisópolis, em dezembro de 2019, que provocou a morte de nove jovens.
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Laerte
As charges foram publicadas em dezembro do ano passado e apenas agora, seis meses depois, a Associação de Oficiais Militares do Estado de São Paulo em Defesa da Polícia Militar (Defenda PM), ingressou na Justiça. A entidade pede esclarecimentos da Folha e dos chargistas sobre os desenhos que, conforme a Associação, constrangem a ela e a seus associados. A interpelação ocorre justamente em um momento de ameaças do governo de Jair Bolsonaro (sem partido) à democracia e de declarações cada vez mais agressivas do presidente contra a Folha e parte da imprensa. Não por acaso, a Associação de Oficiais é conhecida por abrigar setores ultra conservadores e radicalizados da Polícia Militar de São Paulo, bastante próximos do bolsonarismo. O presidente da Associação é o coronel Elias Miler da Silva, assessor parlamentar do senador Major Olímpio (PSL-SP).
O advogado da Folha, Luís Francisco de Carvalho Filho, caracteriza a interpelação como impertinente, autoritária e despida de lógica . Para ele, a intenção de quem faz isso é intimidar a imprensa .
João Montanaro
Entidade de cartunistas do RS critica tentativa de censura
O Sintrajufe/RS conversou com o cartunista Hals, presidente da Grafistas Associados do Rio Grande do Sul (Grafar), sobre o caso. Para ele, trata-se de uma ação, primeiramente, intimidatória , vinda de uma associação que é a fina flor do bolsonarismo na polícia . Hals concorda que a tentativa de censura é um reflexo do atual momento político, mas comenta a ironia do caso: esse arbítrio acontece num meio de comunicação que foi fundamental para chegarmos no estado onde chegamos. Esse radicalismo da direita vem ganhando corpo desde antes do golpe contra a presidenta Dilma e, ou a mídia fez vistas grossas para os excessos cometidos pelo reacionarismo, ou participou, dando voz a eles como uma manifestação legítima .
Bennet
Para Hals, vemos, nacionalmente, setores das Forças Armadas ameaçando diariamente a democracia, ainda que outros setores militares critiquem essas ameaças, e o que temos, no caso da ação dessa organização, é algo parecido. Eles se sentem constrangidos porque publicaram algo que critica o que eles realmente fizeram. Charges são opinião, mas baseadas em fatos reais. A ação da polícia em Paraisópolis foi planejada para causar dano físico, baseado na operação de transformar as ruas e vielas em uma grande arapuca. Como a charge usa o humor e o desenho, que é uma linguagem universal, a denúncia e a interpretação do fato pode ser muito mais pungente do que uma descrição formal da ação policial. A charge do Laerte, por exemplo, é matadora quando coloca as vítimas da polícia cercadas por um labirinto, transmitindo não só a violência do ato mas o desespero de quem estava cercado sem poder fugir, muito menos se defender .
No Rio Grande do Sul, Sintrajufe/RS atuou contra censura a exposição de charges em 2019
Os ataques a chargistas que criticam o atual estado de coisas no Brasil não é novidade. Em setembro de 2019, a exposição de cartuns e charges “Riso em RiscoIndependência em Risco” foi retirada da Câmara de Vereadores de Porto Alegre menos de 24 horas após a inauguração, por determinação da presidente da Casa, Mônica Leal (PP). A mostra trazia desenhos com críticas ao governo de Jair Bolsonaro, motivo pelo qual alguns vereadores trataram de censurar a exposição. Na ocasião, o Sintrajufe/RS participou de mobilizações contra a censura e, depois, abrigou a exposição na sede do sindicato.