SINDICATO DOS TRABALHADORES DO JUDICIÁRIO FEDERAL E MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO - FUNDADO EM 28 DE NOVEMBRO DE 1998 - FILIADO À FENAJUFE E CUT

EMPREENDEDORISMO OU PRECARIZAÇÃO?

Garis “microempreendedores” na capital: suspensão, pelo STF, de processos sobre pejotização permite drible em direitos trabalhistas

Empreendedores ou trabalhadores precarizados? Para o Supremo Tribunal Federal (STF), garis e lixeiros de Porto Alegre podem ser enquadrados como “microempreendedores individuais”. É assim que muitos estão sendo contratados por uma das empresas terceirizadas que operam a coleta de lixo na capital gaúcha, um verdadeiro abracadabra na legislação trabalhista. Essa prática havia sido condenada pela Justiça do Trabalho, mas decisão do STF suspendeu esse e outros milhares de processos que tratam de questões semelhantes. A revogação da reforma trabalhista e da lei das terceirizações é cada vez mais necessária para impedir que a “pejotização” vire regra nas relações entre patrões e empregados.

Matéria publicada nessa quarta-feira, 14, no portal Jota trata da situação dos trabalhadores e trabalhadoras que realizam a coleta de lixo em Porto Alegre. A responsabilidade é do Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU), que já foi referência nacional inclusive na coleta seletiva. Mas os serviços vêm sendo terceirizados e agora cada tipo de operação é realizado por uma empresa diferente.


Decisão da JT confirmou “subordinação objetiva”

Em 2024, matéria publicada no site do TRT4 informa que a 2ª Turma do tribunal “confirmou a existência de vínculo de emprego entre um gari/coletor de lixo e uma empresa prestadora de serviços de limpeza. A condenação reconheceu, ainda, a responsabilidade subsidiária do Departamento Municipal de Limpeza Urbana de Porto Alegre (DMLU), tomador dos serviços”. O julgamento tratava do caso de um trabalhador contratado como pessoa jurídica, a chamada “pejotização”. De acordo com o processo, o gari se cadastrou com CNPJ na Prefeitura um dia antes de formalizar o contrato de prestação de serviços com a empresa contratada pelo Município. Uma exigência da empresa que evidenciou a fraude, conforme o entendimento da magistrada. Conforme testemunhas ouvidas no processo, a prática é comum. A matéria não refere qual das empresas terceirizadas pelo DMLU é a envolvida. A empresa e a Prefeitura recorreram ao Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Gilmar Mendes suspendeu processos: no RS, cerca de 8 mil

Porém, em abril deste ano, o ministro do STF Gilmar Mendes decidiu suspender todos os processos, em todo o país, que tratam da pejotização. A suspensão foi sustentada na decisão do STF de que um processo em julgamento na Corte teria repercussão geral sobre o tema – o recurso extraordinário 1532603, no qual será julgado o reconhecimento ou não de vínculo empregatício entre um corretor e uma seguradora, considerando a existência de um contrato de prestação de serviços entre as partes, no formato de franquia. São milhares de processos suspensos – apenas no Rio Grande do Sul, conforme o TRT4, são cerca de 8 mil.

Decisão de Gilmar é nova fase de ataques à competência da Justiça do Trabalho

Em fevereiro de 2024, durante sessão do STF, os ministros Dias Toffoli e Luiz Fux fizeram críticas à atuação da Justiça do Trabalho, chegando a insinuar que as propostas de extinção do órgão acabam justificadas por “excessos” da JT. Os ministros disseram que há decisões que “ignoram o devido processo legal” e resultam em responsabilizações indevidas de empresas sem conexão com o vínculo trabalhista. As críticas foram direcionadas especificamente à “desconsideração da personalidade jurídica”, medida que permite responsabilizar os sócios ou administradores de uma empresa – ou outra empresa – por atos ilegais: “Vamos falar português claro: ao fim, ao cabo, eu não sei se a Justiça do Trabalho vai fazer o devido processo legal ou se vai fazer uma desconsideração de fantasia, uma desconsideração fake news. Nós somos suprema corte, nós não somos jejunos”, disse Toffoli.

Já Fux afirmou que há falta de compromisso da Justiça do Trabalho com o devido processo legal: “A Justiça do Trabalho faz desconsiderações sem compromisso e sem obedecer o devido processo legal”, disse. Apontou, ainda, que a CLT incluiu a desconsideração da personalidade jurídica justamente para criar um freio aos abusos, mas que não é isso o que tem sido feito: “Isso veio para criar um freio. Nós não podemos fechar os olhos para a realidade, a Justiça do Trabalho, com todo o nosso respeito, redireciona a execução sem o menor compromisso com o devido processo legal”. Dias Toffoli lembrou ainda os ataques à Justiça do Trabalho e as tentativas de extinguir o ramo. Para ele, “excessos” cometidos pela Justiça do Trabalho impulsionam essas ações: “Eu defendi a Justiça do Trabalho. Eu penso que a Justiça do Trabalho, infelizmente, ainda é fundamental num país desigual. Mas eu dizia: isso está acontecendo por excessos”, afirmou.

Estudo realizado por juízes e pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) aponta que o Supremo Tribunal Federal (STF) retirou da Justiça do Trabalho e mandou para a Justiça Comum 21% dos casos sobre terceirização e uberização. Foram analisadas 1.039 decisões do STF, colegiadas ou monocráticas, no intervalo de 1º de julho de 2023 a 16 de fevereiro de 2024.

Desde 2023, o Sintrajufe/RS vem denunciando o problema em matérias e participando de atividades e ações juntamente com outras entidades para defender a competência da Justiça do Trabalho frente a decisões do STF. Em fevereiro de 2024, por exemplo, o sindicato participou da Mobilização Nacional em Defesa da Competência da Justiça do Trabalho, que ocorreu em mais de 50 cidades em todo o país e, em Porto Alegre, lotou o auditório das varas trabalhistas. Já em abril deste ano, reunião do Fórum Institucional de Defesa da Justiça do Trabalho (Fidejust), do qual o Sintrajufe/RS faz parte, tratou de iniciativas conjuntas com o objetivo de defender a competência da Justiça do Trabalho para conciliar e julgar os conflitos das relações de trabalho no sentido amplo.

Presidente do TRT4 critica “propostas voltadas ao estreitamento da competência material” da JT

Nessa segunda-feira, 12, durante a sessão do Tribunal Pleno do TRT4, o presidente do tribunal, desembargador Ricardo Martins Costa, fez um pronunciamento em defesa da competência constitucional da Justiça do Trabalho. Ele denunciou que “a Justiça do Trabalho, em razão de atuar normas vocacionadas à proteção da parte mais fraca em uma relação que se afigura, em sua versão individual, ordinariamente assimétrica, conhece e já experimentou ataques forjados com base na ideologia que orienta os poderes hegemônicos no campo da economia”. Disse, ainda, que “por meio da justa disposição para construir alternativas de reafirmação da Justiça do Trabalho, ao contrário de propostas voltadas ao estreitamento de sua competência material, é oportuno e conveniente construir soluções focadas na ampliação dessa competência”.

Sintrajufe participou de mobilização nacional no início de maio

Atos públicos foram realizados em todo o país na última quarta-feira, 7, convocados como Mobilização Nacional em Defesa da Competência da Justiça do Trabalho. O Sintrajufe/RS, a Fenajufe e a CUT estiveram entre as entidades que convocaram as manifestações. No Rio Grande do Sul, a data registrou manifestações em Porto Alegre, Pelotas, Santa Maria e Taquara. Em Porto Alegre, o ato público ocorreu em frente ao prédio das varas trabalhistas, reunindo servidores e servidoras, magistrados, advogados, centrais sindicais e sindicatos de diversas categorias.

Ministério Público do Trabalho denuncia que reforma trabalhista abriu portas para a pejotização

No dia 9 de maio, em sessão especial do Senado Federal em homenagem ao Dia do Trabalhador e da Trabalhadora, o Ministério Público do Trabalho (MPT) também criticou a flexibilização das leis trabalhistas no Brasil. A instituição foi representada pela coordenadora nacional de Defesa do Meio Ambiente do Trabalho e da Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (Codemat) do MPT, Cirlene Luiza Zimmermann. Em seu discurso, a procuradora do Trabalho afirmou que a reforma trabalhista foi um grande impulsionador da perda de direitos. A representante explicou que, quando há um ataque aos sindicatos, às representações coletivas dos trabalhadores, há o desvirtuamento da relação capital-trabalho prevista pela Constituição.

Cirlene Zimmermann também apontou que o aumento da pejotização é reflexo da reforma trabalhista. “Se estamos combatendo a pejotização e a utilização de diversos tipos de contratos para desvirtuar trabalhadores e trabalhadoras e o Direito do Trabalho, é justamente porque a reforma trabalhista abriu essas portas que precisam ser novamente fechadas por esse Congresso Nacional”, destacou.

Foto: Pedro França/Agência Senado