A anulação do leilão de privatização, o fim do sigilo do processo e a criação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan) na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul foram as demandas apontadas por partidos, deputados e deputadas, centrais e sindicatos, durante plenária unificada realizada nessa terça-feira, 1º, em Porto Alegre. O ato lotou o Plenarinho da Assembleia e contou também com a participação de prefeitos e vereadores de várias cidades, que vieram reforçar a luta contra a venda da empresa pública que atende 307 dos 497 municípios gaúchos e 6 milhões de pessoas, cerca de dois terços da população do Estado.
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Baseados nos pareceres do Ministério Público de Contas e no voto técnico pela anulação do leilão, com mais de 300 páginas, da conselheira Ana Cristina Moraes, do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RS), parlamentares do PT, Psol e PCdoB ressaltaram as graves irregularidades cometidas pelo governo Eduardo Leite (PSDB) na definição do preço de venda da Corsan. Os deputados anunciaram que irão acionar o Ministério Público, o TCE e a Polícia Civil para tentar reverter a privatização. O principal ponto de contestação é o valor da venda da estatal, arrematada em leilão por R$ 4,1 bilhões.
Entenda
A anulação da venda da Corsan vem sendo defendida política e judicialmente por diversas entidades e agentes políticos desde que o leilão foi realizado, em dezembro do ano passado. Em ação popular movida pelo Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Purificação e Distribuição de água e em Serviços de Esgoto do Estado do Rio Grande do Sul (Sindiágua/RS), são listados cinco motivos para anular a venda:
1) As empresas responsáveis pela avaliação da Corsan foram contratadas diretamente pela companhia, com dispensa de licitação, contrariando as legislações estadual e federal que exigem a realização de licitação para este fim.
2) O edital foi omisso quanto à existência de inúmeros contratos de financiamento existentes, principalmente da Caixa Econômica Federal. Não há notícias de que a Caixa tenha aprovado a transferência de titularidade da companhia, o que pode causar imenso prejuízo não só ao Estado como a diversos municípios.
3) Mesmo com a transferência de venda de julho (quando estava marcado a realização de um IPO) para dezembro, não foi refeita a avaliação da companhia.
4) Os dados relativos ao déficit da Fundação Corsan, que trata da previdência complementar de funcionários e aposentados, são inconsistentes. No entanto, a decisão da Corsan, após publicar o edital de venda, de arcar com a sua parte no equacionamento, embora correta, apesar do valor insuficiente, significa a concessão de um desconto de R$ 640 milhões para a Aegea.
5) Diante da sua relação contratual com a Corsan, a única participante e vencedora do leilão não poderia ter sequer participado por deter informações privilegiadas que legalmente a impedem.
Manifesto
Ao final da plenária, foi apresentado e lido um manifesto dos parlamentares e entidades sindicais sobre a situação da Corsan e denunciando o processo nebuloso de privatização. Leia abaixo a íntegra do manifesto aprovado na plenária:
Manifesto pela Anulação do leilão da Corsan
A população gaúcha está diante do caso mais nebuloso de sua história recente. A venda da Corsan é repleta de irregularidades e suspeitas. Está comprovado que a companhia foi vendida por um valor muito abaixo do que ela realmente vale. Uma diferença de ao menos R$ 1,5 bilhão desfavorável ao Rio Grande do Sul.
Desde 2018, quando garantiu que manteria a Corsan pública, o governador Eduardo Leite quebra a própria palavra e adota medidas graves. Leite permitiu a farra com dinheiro público que beneficiou dezenas de consultorias contratadas sem licitação.
Duas delas configurando episódios de conflito de interesse e suspeita de fornecimento de informações privilegiadas. A Alvarez & Marsal, por exemplo, prestou serviços simultâneos para a Corsan e para a AEGEA. Já a CMT Advocacia tem em seu quadro societário um irmão e um primo de um alto diretor da AEGEA.
Durante todo o processo, o Governo Leite atropela as instituições. O leilão da Corsan, realizado em dezembro do ano passado, ocorreu mesmo com o Tribunal de Contas do Estado apontando problemas na definição do preço de venda (valuation) e impedindo a assinatura do contrato.
No momento do certame, apenas a AEGEA estava em plenas condições de participar e, também por isso, apresentou o preço mínimo.
De lá para cá, o governador Leite e sua equipe seguiram em uma pressão descabida para que o contrato entre Governo do Estado e AEGEA fosse assinado. A preocupação deles nunca foi com a defesa do interesse público nem com a correção do processo. Em uma ação inédita em mais de 80 anos de existência do Tribunal de Contas e articulada com o presidente Alexandre Postal, o governo obteve uma decisão precária que permitiu a assinatura do contrato mesmo antes da corte concluir o julgamento do processo que está em fase final de tramitação.
Não por acaso o Governo Leite pede a manutenção do sigilo do processo, mesmo quando o julgamento for concluído, e trabalha para barrar a instalação de uma CPI na Assembleia Legislativa. Um momento que afronta as atribuições do Poder Legislativo de fiscalizar o Poder Executivo e atentam contra os princípios da administração pública da publicidade e transparência.
Sem jamais corrigir os problemas técnicos do processo, Eduardo Leite assinou o contrato com a AEGEA menos de duas horas depois de receber a autorização do presidente do Tribunal de Contas Alexandre Postal, com o claro intuito de estabelecer o fato como consumado.
O Tribunal de Contas do Estado, no entanto, precisa concluir o julgamento do mérito. Na Primeira Câmara do TCE já se estabeleceu a maioria para anulação do leilão e os atos que o sucederam.
Dos três conselheiros do colegiado, dois já votaram pela anulação. Resta um voto que ainda não foi proferido e será impossível os demais conselheiros desconsiderarem as mais de 300 páginas do voto da conselheira Ana Cristina Moraes, que apontou várias irregularidades e o flagrante prejuízo ao erário.
Além da maioria no colegiado, a anulação do leilão também tem o aval do Ministério Público de Contas.
Diante de tudo isso, os partidos e entidades defendem:
“ A anulação do leilão de venda da Corsan e, consequentemente, a assinatura do contrato entre Governo do Estado e AEGEA;
“ O fim do sigilo do processo para que a população gaúcha conheça os fatos;
“ Instalação da CPI da Corsan na Assembleia Legislativa, para que seja cumprido o dever constitucional de fiscalização dos atos do Executivo.
Editado por Sintrajufe/RS; fonte: CUT/RS