SINDICATO DOS TRABALHADORES DO JUDICIÁRIO FEDERAL E MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO - FUNDADO EM 28 DE NOVEMBRO DE 1998 - FILIADO À FENAJUFE E CUT

PL 1958/21

CCJ do Senado analisa renovação das cotas raciais no serviço público; lei atual terá vigência encerrada em junho

Na última quarta-feira, 17, pedido de vista coletivo interrompeu a discussão, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), do projeto de lei (PL) 1.958/2021. O PL atualiza e amplia a política de cotas raciais no serviço público.

O projeto foi apresentado em 2021 pelo senador Paulo Paim (PT-RS) para ampliar o período de vigência da lei 12.990/2014, que criou as cotas para negros e negras em concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública federal, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista controladas pela União. A lei reservou 20% das vagas nesses concursos para pessoas negras, mas definiu sua vigência por apenas dez anos, até 9 de junho de 2024.

Cotas por mais 25 anos e com ampliação do percentual

O projeto de Paim definia um novo prazo de mais dez anos a partir de sua aprovação, com a justificativa de que “passado o tempo estipulado para sua vigência, a política deve ser reavaliada, a partir dos dados objetivos da realidade que se pretendia impactar. Se a realidade foi positivamente impactada e os resultados pretendidos foram alcançados, não há mais razão para sua permanência. De outro lado, se os resultados não foram alcançados ou apenas o foram parcialmente, a política deve permanecer”. A Justificação aponta ainda que “teremos alcançado um resultado adequado quando o número de pretos e pardos na administração pública federal corresponder ao percentual desse segmento populacional na população total do país”. Durante a tramitação na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), o senador Fabiano Contarato (PT/ES), que relatou o projeto, incluiu em seu parecer a ampliação desse prazo para mais 25 anos a partir da aprovação da nova lei, “considerando que os concursos e os processos seletivos simplificados são extremamente heterogêneos. A título de exemplo, há carreiras cuja renovação do quadro de servidores é lenta e a realização de concursos demora vários anos. Além disso, se os objetivos forem atendidos antes do esperado, os órgãos responsáveis pelo acompanhamento e monitoramento da ação afirmativa divulgarão essa informação”.

Além disso, o relator ampliou a reserva de 20% para 30% das vagas, metade delas para mulheres negras. O substitutivo de Contarato também define que, em concursos públicos para provimento de cargos efetivos no âmbito do Ministério dos Povos Indígenas e da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), deverão ser reservadas a indígenas de 10% a 30% das vagas.

Tramitação difícil

Na CDH, o parecer foi aprovado em dezembro do ano passado, e desde então aguarda deliberação na CCJ. Na nova comissão, o relator é o senador Humberto Costa (PT-PE), que apresentou seu parecer no dia 8 de março, no termos do substitutivo de Contarato, incluindo, depois, algumas emendas com ajustes nos procedimentos.

Outras emendas apresentadas não foram incluídas pelo relator, pois, na prática, visavam acabar com as cotas raciais. Essa tentativa de alguns senadores demonstra que a política de cotas está, de fato, sob risco. Na sessão do dia 17, Humberto Costa leu seu relatório, mas o presidente da Comissão, Davi Alcolumbre (UB-AP), concedeu pedido de vista coletivo antes do início da discussão “por considerar que essa matéria divide os senadores desta comissão”. Agora, o PL está na pauta da próxima reunião da Comissão, marcada para as 10h desta quarta-feira, 24. O projeto tramita em caráter terminativo e, após análise na CCJ, seguirá para a Câmara dos Deputados.

Cotas no Judiciário

No âmbito do Poder Judiciário, as cotas raciais foram introduzidas em 2015, quando o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) publicou a Resolução 203, estabelecendo a reserva de 20% das vagas de concursos públicos para negros e negras. Entretanto, oito anos após a implementação, os dados apontam pouca efetividade dessa política. Segundo a Folha de S.Paulo, desde 2015, nos concursos para juízes apenas duas em cada cinco vagas foram preenchidas nos tribunais de Justiça estaduais e nenhuma nos tribunais regionais federais. Além disso, em 2022 apenas 14,5% dos magistrados se identificaram como pretos ou pardos. Esses dados destacam a urgência de ampliar o debate sobre os desafios enfrentados pela população negra no ingresso ao serviço público. Afinal, é essencial reconhecer que antes mesmo de ingressar no funcionalismo, a população negra enfrenta obstáculos relacionados ao acesso a direitos básicos que historicamente foram negligenciados.

De acordo com Magali Dantas, técnica judiciária na Justiça Federal do Rio Grande do Sul e integrante do Grupo de Trabalho para Ações em Direitos Humanos, Equidade de Gênero, Raça de Diversidades e da Rede de Direitos Humanos do sistema de Justiça do estado, a baixa representatividade de pessoas negras no Poder Judiciário é um reflexo da profunda desigualdade estrutural no país. Para ela, para garantir a eficácia das cotas raciais é necessário adotar medidas complementares, como a promoção da diversidade nas bancas examinadoras, e incentivos, como o Programa Esperança Garcia, da Advocacia-Geral da União, que distribui bolsas para a preparação das provas. Outro aspecto seria a apropriação, pelos tribunais, da formação e execução das bancas de heteroidentificação como instrumento para garantir o acesso efetivo das pessoas negras às vagas reservadas. “Isso possibilitará a capilaridade do letramento racial, discussão de conteúdos jurídicos antidiscriminatórios, contribuindo para a formação de uma massa crítica no Poder Judiciário. Essa massa crítica estará mais bem preparada para enfrentar o racismo presente em nossa sociedade, inclusive durante a prestação jurisdicional”.

Com informações da Fenajufe