Em 2022, 33,1 milhões de brasileiros e brasileiras não têm o que comer. No Rio Grande do Sul, 14,1% dos domicílios registram insegurança alimentar grave, ou seja, fome. É o estado da região sul com os piores índices. O Paraná tem 8,6% dos lares em situação de insegurança alimentar grave e Santa Catarina, 4,6%. Os dados são do 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil , divulgado pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar (Penssan).
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O relatório destaca que os diferentes cenários entre estados apontados na pesquisa ocorrem diante de uma série de fatores, como dinâmicas populacionais e estruturas socioeconômicas. As diferenças entre os Estados estão ligadas tanto aos processos históricos de suas dinâmicas populacionais, estruturas socioeconômicas e processos políticos, quanto à aderência das decisões político-administrativas e das agendas de organizações sociais às necessidades de suas populações locais , aponta o estudo.
Abrindo mais o leque, levando em conta a insegurança alimentar moderada, o levantamento mostra que 25,4% dos lares gaúchos enfrentam algum tipo de falta de alimento. E também aponta que 64% das famílias que se encaixam nessa situação têm renda de até meio salário mínimo por pessoa.
Integrante da Rede Penssan e presidente do Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável (Consea-RS), Juliano de Sá faz um alerta em relação à presença de crianças em lares com insegurança alimentar moderada ou grave. No estado, apenas quatro em cada 10 domicílios com crianças de até 10 anos têm segurança alimentar.
Sá destaca que esse cenário pode desencadear problemas que vão além da vulnerabilidade social, pois também afeta questões biológicas. Essas crianças poderão estar mais sensíveis a doenças, o que pode desencadear, no médio prazo, uma série de questões sobre seu desenvolvimento como um todo.
Transferência de renda
O relatório da Rede Penssan mostra que, mesmo com o programa Auxílio Brasil com alta cobertura em praticamente todos os estados, as famílias com rendimentos de até meio salário mínimo por pessoa não apresentaram melhora significativa no acesso à alimentação adequada. O Rio Grande do Sul não apresentou diferença significativa na prevalência de insegurança alimentar moderada e grave entre domicílios com ou sem recebimento de recursos do Auxílio Brasil.
O presidente do Consea-RS destaca que o Auxílio Brasil teria mais efeito no combate à fome em um ambiente com outras políticas públicas. Eu acredito que teria mais resultados se estivesse conectado com outras políticas, como por exemplo, valorização do salário mínimo, aumento de emprego e renda, subsídios para baixar o preço dos alimentos, formação de estoques públicos, compras governamentais de alimentos da produção local e outros , explica Sá.
Já não fazem mais parte da realidade brasileira aquelas políticas públicas de combate à pobreza e à miséria que, entre 2004 e 2013, reduziram a fome a apenas 4,2% dos lares brasileiros. As medidas tomadas pelo governo para contenção da fome hoje são isoladas e insuficientes, diante de um cenário de alta da inflação, sobretudo dos alimentos, do desemprego e da queda de renda da população, com maior intensidade nos segmentos mais vulnerabilizados , avalia Renato Maluf, Coordenador da Rede Penssan.
O que significa insegurança alimentar
Insegurança alimentar grave é caracterizada por sentir fome e não comer por falta de dinheiro para comprar alimentos, fazer apenas uma refeição ao dia ou ficar o dia inteiro sem comer. O grau moderado é quando há redução quantitativa de alimentos e/ou ruptura nos padrões de alimentação resultante de falta de alimentos; o leve se caracteriza por preocupação ou incerteza em relação ao acesso aos alimentos no futuro e/ou consumo de alimentos de qualidade inadequada para não comprometer a quantidade.
No Brasil, seis em cada dez famílias sofre com algum grau de insegurança alimentar. Nesse quadro mais amplo, são 125,2 milhões no país. O avanço da fome fez o Brasil retroceder a patamares dos anos 1990.
Alagoas registra a maior proporção de pessoas que passam fome; pelo menos 36,7% se encontram em insegurança alimentar grave no Estado. Em números absolutos, a maior concentração de pessoas em situação de insegurança alimentar está em São Paulo (6,8 milhões) e no Rio de Janeiro (2,7 milhões).
Endividamento
O estudo sugere que é possível fazer uma associação entre o endividamento e a fome. O motivo é que a frequência de famílias endividadas nos estados do Norte e do Nordeste é maior. Em Alagoas, estão nessa situação 57,5% das famílias, número que chega a 52,6% no Amazonas. O Distrito Federal, com 55,6%, também se destaca negativamente nesse quesito.
Mesmo as famílias que recebem o Auxílio Brasil, por estarem endividadas, não conseguem utilizá-lo somente para a compra de alimentos. O recurso precisa ser utilizado para pagar outras necessidades básicas, como aluguel, transporte, luz e água , explica Ana Maria Segall, pesquisadora da Penssan e da Fiocruz.
Fonte: Rede Penssan, G1, GZH, Aventuras na História