SINDICATO DOS TRABALHADORES DO JUDICIÁRIO FEDERAL E MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO - FUNDADO EM 28 DE NOVEMBRO DE 1998 - FILIADO À FENAJUFE E CUT

ASSÉDIO MORAL E SEXUAL NO TRABALHO

Foco em metas e produtividade estimulam abuso e assédio no trabalho, aponta painelista em jornada de formação do Sintrajufe/RS

Com as modificações realizadas no ambiente de trabalho em função das medidas contra a pandemia, os pesquisadores e as pesquisadoras se encontram sem dados estatísticos sobre a evolução do assédio moral e sexual nesses contextos, mas as denúncias revelam uma realidade preocupante, afirmou a médica e professora Margarida Barreto. Ela foi a painelista da abertura da jornada de formação do Sintrajufe/RS “A saúde dos trabalhadores e trabalhadoras ameaçada. Trabalhar, sim. Adoecer, não”. A atividade foi transmitida ao vivo, nessa quinta-feira, 29, com o tema “Prevenindo e enfrentando o assédio moral e sexual no trabalho”. A mediação foi da diretora do sindicato Mara Weber e contou com a participação da desembargadora do TRT4 Tânia Reckziegel, coordenadora da Comissão de Prevenção e Enfrentamento do Assédio Moral e do Assédio Sexual do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Mara Weber apresentou as participantes e deu as boas-vindas ao público, lembrando da importância de iniciativas como essa, principalmente em época de isolamento social, para a manutenção dos laços afetivos entre as trabalhadoras e trabalhadores, fortalecendo e esperançando a nossa ação e nossa consciência de classe. Mara enfatizou a importância da jornada neste momento, em que o capitalismo em sua fase neoliberal impõe a destruição dos direitos sociais, aumenta a violência social, a precarização do trabalho. Destacou ainda que é preciso entender saúde do trabalhador e trabalhadora como luta de classe. E o trabalho remoto compulsório por conta da pandemia também trouxe novos desafios numa realidade onde a correlação de forças capital trabalho está bastante desigual o que nos desafia a buscar cada vez mais a unidade pra enfrentar as opressões, que se apresentam de diversas formas mas o opressor é o mesmo.

Mara destacou também a importância da presença da Desembargadora Tânia Reckziegel e relembrou a luta pela instalação das comissões e comitês de enfrentamento ao assédio moral e sexual nos órgãos do Judiciário Federal e do MPU, mas, apesar desse avanço, ainda temos muito que evoluir no processo de acolhimento das denúncias e proteção dos e das denunciantes e que contamos com o diálogo com o CNJ para que haja essa discussão.

A dirigente também fez uma saudação às 21 entidades e instituições parceiras. A atividade foi assistida por quase 400 pessoas durante a transmissão.

Transparência no Judiciário

Saudando as colegas de mesa e ouvintes, a desembargadora do TRT4 Tânia Reckziegel, que é também coordenadora da Comissão de Combate ao Assédio Moral e Sexual do CNJ, fez uma saudação, na qual reforçou a importância da denúncia e efetiva resolução desses casos.

Ela trouxe também o exemplo da experiência da criação da Política de Prevenção e Enfrentamento ao Assédio Moral e Assédio Sexual e de Discriminação no âmbito do Poder Judiciário, expressa na resolução 351/2020, aprovada em 20 de outubro.

Segundo Tânia, a luta para instituir essa política foi delicada, porque falar de assédio dentro do próprio ambiente de trabalho é um tema espinhoso, mas indispensável para garantir que este seja saudável e seguro para aqueles profissionais que acolhem as denúncias da sociedade sobre este tema.

Para além da desigualdade de gênero

A médica Margarida Barreto é professora de Medicina do Trabalho da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo e professora convidada na USP e no Instituto Oscar Freire. É autora, entre outros, dos livros “Assédio moral – Gestão por humilhação”, “Violência, saúde e trabalho, uma jornada de humilhações”, “Do assédio moral à morte de si” (organizadora).

Ela iniciou sua apresentação destacando que as ocorrências de assédio têm como causa principal a forma de gestão das empresas que, com foco na produtividade e estimulando a concorrência a partir do medo do desemprego, levou ao rompimento dos laços fraternos nos ambientes de trabalho, o que gera todo tipo de abuso de autoridade e de poder. Mostra disso é que o assédio, em 25% dos casos, ocorre entre colegas do mesmo nível hierárquico – ou seja, não se trata um fenômeno individual, mas social. Por isso, mesmo no funcionalismo público não está livre do assédio, porque ainda que a gestão tenha diferenças, a lógica social e de poder é a mesma.

Margarida afirmou que o assédio é visivelmente mais praticado contra mulheres, negros e negras e pessoas de orientação sexual não normativa. Essa situação é um reflexo direto das desigualdades de condições de trabalho a que estão submetidos esses grupos sociais.

Segundo a médica, neste momento, o Brasil é um dos países mais desiguais no planeta, tendo que enfrentar temas como a desigualdade estrutural, a violência institucionalizada, a violência como exercício de poder, que se alastra, discrimina e é naturalizada. A desigualdade social não é exclusividade do nosso país, já que em muitos países chamados desenvolvidos os 10% mais ricos igualmente detêm 60% da riqueza nacional.

Mas, aqui, a situação também é de desigualdade de gênero, raça, geração, geográfica e de acesso aos serviços públicos. Essa desigualdade se tornou mais aguda com o surgimento da crise econômica derivada do isolamento social. O trabalho remoto, também consequência desse contexto, teria intensificado o trato violento nas relações de trabalho.

Empreendedorismo como forma de nova escravidão

A prática de assédio em ambiente de trabalho seria fruto do próprio sistema capitalista, e sua fase atual de neoliberalismo financeirizado que busca sempre um Estado mínimo, que opera a favor dos mais ricos e que está instituindo uma ilusão de empreendedorismo aos trabalhadores e trabalhadoras, que leva à perda da consciência de classe. Deixando de ser empregado e se tornando “parceiro” ou “colaborador” através de denominações como MEI, EPP (empresa de pequeno porto), EI (empresário individual) e outras, o trabalhador e a trabalhadora perdem a consciência sobre a própria condição de opressão.

Mais do que isso, inicia-se um processo de autocoerção, de autoexploração por parte do próprio trabalhador e trabalhadora, que, sustentando a ilusão de que são livres, ficam em silêncio ante situações coercitivas, motivados pelo medo de perder o posto. A violência como exercício de poder do contratante segue sendo exercida. O trabalhador e a trabalhadora se desesperam buscando formas para obterem uma remuneração mais consistente, que creem dependerem dele e delas somente. Segundo a médica, isso leva, progressivamente, à angústia, ao desespero, à depressão, que redundam em Burnout (distúrbio psíquico relacionado ao trabalho, causado pela extrema exaustão extrema) ou, em alguns casos, mesmo em suicídio.

Fim do silêncio

Margarida aponta que o enfrentamento dessa realidade exige a denúncia e uma postura intolerante com a violência e contra o silêncio institucional, o silêncio branco, hétero e todos os silêncios que encubram os fatos em busca do favorecimento por um grupo em detrimento de minorias.

Por mais difícil que a situação de denúncia se revele, torna-se necessária a criação de dispositivos para que quem denuncie se sinta segura e acolhida em sua condição.

Próximo evento acontece dia 6 de maio

A jornada continua na próxima quinta, 6 de maio, também às 18h30min, com o painel “Formação do Estado brasileiro: as raízes da subalternidade”. que contará com a presença do cientista político Henrique Carlos Oliveira de Castro e da filósofa e escritora Márcia Tiburi.

Todos os eventos da jornada são transmitidos pelo canal do YouTube do Sintrajufe/RS e Facebook do sindicato e das entidades parceiras.

Entidades parceiras:
TRT4 e Escola Judicial do TRT4
Fenajufe (Judiciário Federal e MPU) e Fenajud (Judiciário Estadual)
CUT/RS e CUT Regional Centro RS (Santa Maria e região) e FSST
Sindicatos do Judiciário Federal/MPU: Sindjuf/PA-AP, Sintrajuf/PE, Sisejufe/RJ, Sintrajusc/SC e Sindiquinze/SP
Sindicatos do Judiciário Estadual: Sindjustiça/GO, Sindijus/PR e SinjuSC/SC
Sindicatos de outras categorias: Assufsm, Cpers/RS, Semapi/RS, Sindiágua/RS, Sindipetro/RS, Sindjor/RS, APP Sindicato (educação pública do Paraná)