SINDICATO DOS TRABALHADORES DO JUDICIÁRIO FEDERAL E MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO - FUNDADO EM 28 DE NOVEMBRO DE 1998 - FILIADO À FENAJUFE E CUT

VOTO IMPRESSO

Bolsonaro usa defesa do voto impresso como escada para o golpismo, tom aumenta na medida da queda da popularidade

A pouco mais de um ano da data prevista para as eleições de 2022, o bolsonarismo vem dando claros sinais de que as discussões em torno das urnas eletrônicas serão utilizadas como escada para a escalada golpista caso Jair Bolsonaro (sem partido) seja derrotado no voto em sua possível tentativa de reeleição. Caso termine o mandato – pois as pressões pelo fim de seu governo aumentam nas ruas – Bolsonaro enfrentará uma disputa difícil, que pode ter no ex-presidente Lula (PT) o grande favorito, conforme apontam as pesquisas de opinião deste momento. Assim, Bolsonaro acelera a preparação do terreno golpista, a exemplo da tentativa de invasão frustrada no Capitólio, sede do legislativo norte-americano, por ocasião da posse de Joe Biden.

Em 2018, antes de vencer a eleição (com Lula tendo sido retirado da disputa por processos questionados agora pelo próprio Judiciário), Bolsonaro já denunciava uma “fraude” eleitoral que o prejudicaria. Mesmo tendo vencido, Bolsonaro continuou a alimentar a discussão, colocando em dúvida a segurança das urnas eletrônicas e defendendo o voto impresso como alternativa.

Ao longo de seu governo, Bolsonaro não abandonou seu caráter autoritário, seja no discurso, seja nas práticas. Ataques e ameaças à imprensa, celebrações à ditadura de 1964 e a torturadores e outras falas descompassadas da democracia foram sempre alternados com perseguições a servidores públicos e à oposição, retirada de autonomia e intervenções nas universidades, entre outras medidas. Ao mesmo tempo, os seguidos favorecimentos aos militares servem como tentativa de balancear a perda de popularidade que se acentua a cada semana, aumentando a tutela dos militares sobre a democracia.

O voto impresso

A proposta de voto impresso tramita hoje no Congresso Nacional a partir da PEC 135/2019, apresentada pela deputada Bia Kicis (PSL-DF). A proposta inclui na Constituição o § 12, no art. 14, determinando que, na votação e apuração de eleições, plebiscitos e referendos, seja obrigatória a expedição de cédulas físicas, conferíveis pelo eleitor, a serem depositadas em urnas indevassáveis, para fins de auditoria.

Na tarde desta segunda-feira, 28, o relator da matéria na Comissão Especial que trata do tema, deputado Filipe Barros (PSL-PR), apresentará seu parecer. No final de semana, presidentes de onze partidos se reuniram virtualmente e fecharam posição contra a proposta. Participaram do encontro ACM Neto (DEM), Baleia Rossi (MDB – SP), Bruno Araújo (PSDB), Ciro Nogueira (PP), Gilberto Kassab (PSD), Luciano Bivar (PSL), Luis Tibé (Avante), Marcos Pereira (Republicanos), Paulo Pereira da Silva (Solidariedade), Roberto Freire (Cidadania) e Valdemar Costa Neto (PL). As siglas representam ao todo 326 deputados, o equivalente a 63,5% das cadeiras na Câmara. Para aprovar uma PEC, o governo deve ter 3/5 dos votos do total de deputados, em dois turnos. Outros partidos, como PT e Psol, também já manifestaram posição contra a proposta.

Preocupa, por outro lado, posições dúbias em partidos como o PDT e o PSB, que já acenaram com a possibilidade de apoiar o voto impresso. Mesmo nos partidos representados na reunião do final de semana, há divisões: no caso do PSDB, por exemplo, Aécio Neves já questionou sua própria derrota na disputa pela Presidência, em 2014, questionando a segurança das urnas eletrônicas, em, um ano depois, em meio à onda golpista contra o governo de Dilma Rousseff (PT), defendeu a impressão de “recibos” nas urnas, algo semelhante ao que está proposta agora por Bolsonaro e alguns de seus apoiadores.

A discussão sobre voto impresso já apareceu em outras oportunidades nos últimos anos, tendo seu avanço impedido pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Em 2020, foi travado o mais recente embate nesse sentido: frente à Lei 9.509/2015, da Minirreforma Eleitoral, que, no artigo 59-A, previa a obrigatoriedade de impressão do registro de cada voto depositado de forma eletrônica na urna, o STF decidiu por sua inconstitucionalidade. A decisão foi unânime. Agora, porém, com o tema levantado por meio de uma PEC, a situação no Judiciário fica mais complicada, embora ainda seja claro que a mudança colocaria em risco o sigilo do voto, cláusula pétrea da Constituição.

A segurança das urnas eletrônicas

Em todos os anos eleitorais, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) realiza auditorias de integridade e autenticidade do sistema de votação eletrônica. O procedimento objetiva testar a segurança na captação e contagem do voto pela urna eletrônica. Desde 2002, o TSE comprova que o processo eletivo brasileiro é seguro e que até o momento nunca sofreu algum tipo de violação ou fraude que pudesse colocar em dúvida a legitimidade do processo. Essas auditorias são realizadas de forma pública, com o acompanhamento de cidadãos e cidadãs e de representantes dos partidos políticos e das candidaturas em disputa. Há ainda outras formas de auditoria e controle, como a Cerimônia de Votação Paralela e a conferência do boletim de urna, além das tecnologias de segurança digital. Conheça AQUI os meios de auditoria e de segurança digital e entenda por que as urnas eletrônicas são seguras.

O TSE tem se manifestado constantemente em defesa da segurança das urnas eletrônicas. O tribunal vem divulgando uma série de vídeos como parte de uma campanha de esclarecimento da população sobre o tema. No final de maio, o presidente do Tribunal, ministro Luís Roberto Barroso, destacou, em cerimônia no TRE-MG, a segurança do processo eleitoral brasileiro: “Desde 1996, quando implantado o sistema de urnas eletrônicas aqui no TSE, até hoje, jamais se documentou qualquer episódio de fraude”, destacou o ministro, e completou: “Fraudes havia antes da implantação do voto eletrônico”. Em referência à PEC para a implementação do voto impresso, Barroso apontou as dificuldades técnicas que as impressoras podem oferecer, recordou o entendimento do STF sobre a inconstitucionalidade da medida, tendo em vista o risco que oferece ao sigilo do voto, e apontou o perigo da judicialização desnecessária dos pleitos. “É a solução ruim para um problema que não existe”, afirmou.

Ameaças à democracia e desrespeito aos servidores e servidoras da Justiça Eleitoral

Em declarações que atacam a democracia, o sistema eleitoral e os próprios servidores e servidoras da Justiça Eleitoral, Bolsonaro tem seguidamente colocado em dúvida a legitimidade dos resultados eleitorais. Há poucos dias, em transmissão ao vivo, chamou Barroso de “comunista” e “ditador” e admitiu que pode não reconhecer os resultados das eleições de 2022: “Vai ter sim (voto impresso), Barroso. Vamos respeitar o Parlamento. Caso contrário, teremos dúvidas nas eleições e podemos ter um problema seríssimo no Brasil. Pode um lado ou outro não aceitar, criar uma convulsão no Brasil. Ou a preocupação dele é outra? É voltar aquele cidadão, o presidiário, para comandar o Brasil?”, disse, referindo-se ao ex-presidente Lula, favorito segundo as pesquisas de opinião.

Bolsonaro foi além: “Eu mais do que desconfio, eu tenho convicção de que realmente tem fraude. As informações que tivemos aqui, talvez a gente venha a disponibilizar um dia, é que em 2014 o Aécio (Neves) ganhou eleições e que em 2018 eu ganhei em 1º turno”, continuou. O Tribunal Superior Eleitoral concluiu, em 2015, que não houve qualquer fraude na disputa entre Aécio Neves e Dilma Rousseff para a presidência da República. Em relação a 2018, Bolsonaro jamais apresentou provas de irregularidades na votação.

O diretor do Sintrajufe/RS e da Fenajufe Edson Borowski, servidor da Justiça Eleitoral, entende que a proposta do voto impresso não tem nenhuma questão técnica envolvida. Para ele, a questão é política: “É uma estratégia de desestabilização da Justiça Eleitoral e das eleições já utilizada sem sucesso em outras partes do mundo” . Trata-se, na verdade, destaca Edson, de uma tentativa de “desviar o foco de um governo genocida que não consegue garantir uma gestão decente para este país”.

Com informações do TSE, Fenajufe, Correio Braziliense, Valor Econômico e G1.