Mais de 125 milhões de brasileiros e brasileiras sofreram com insegurança alimentar durante a pandemia, número que equivale a quase 60% da população. A pesquisa, que contempla números entre agosto e dezembro de 2020, foi realizada pelo grupo de pesquisa Alimento para Justiça: Poder, Política e Desigualdades Alimentares na Bioeconomia, com sede na Freie Universití¤t Berlin, na Alemanha. Outras pesquisas corroboram essa situação e mostram, ainda, que os casos mais greves estão em crescimento acentuado: segundo dados do Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19, há quase 20 milhões de brasileiros e brasileiras passando fome.
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Em julho, ganharam destaque nacionalmente cenas gravadas em uma fila do osso na cidade de Cuiabá: dezenas de famílias esperavam para receber de um açougue doações de ossos. As doações eram feitas pelos funcionários pela porta dos fundos do açougue e serviam para aplacar as fomes das famílias, jogadas à miséria pela crise econômica e pela falta de assistência do governo.
A cena choca, mas não é isolada. O crescimento da miséria e da fome no Brasil aparece tanto quando caminhamos pelas cidades quanto nos números.
Nos últimos doze meses, a inflação chegou a quase 9%, incluindo a disparada no preço de alguns alimentos e das contas de luz. O consumo de carne chegou ao menor nível em 25 anos, fazendo com que muitos recorram, por exemplo, aos ossos como única forma de consumir proteína. Em 2020, o consumo de carne bovina caiu 5%, para 36 kg por pessoa. É a maior queda desde 2008 e o 4º ano seguido de redução de consumo, segundo dados compilados pela Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec). Ao mesmo tempo, o desemprego segue crescendo, atingindo oficialmente 14,7% da população ativa, quase 15 milhões de trabalhadores e trabalhadoras. Fora os que desistiram de procurar e os informais.
A crise social aprofunda-se com a redução dos valores do auxílio-emergencial, que eram de R$ 600 e hoje chegam, em média, a apenas R$ 250. No início de julho, dados divulgados pelo boletim “Desigualdade nas Metrópoles” (organizado pela Pucrs, pelo Observatório das Metrópoles e pela RedODSAL) apontaram que, no último ano, 283.080 pessoas a mais passaram a viver com um quarto do salário mínimo (R$ 275) na Região Metropolitana de Porto Alegre. No primeiro trimestre de 2020, quando a pandemia ainda não afetava diretamente o estado, 899.092 pessoas viviam com esta renda per capita oriunda do trabalho. Nos três primeiros meses deste ano este índice subiu para 1.182.172 pessoas. Mais de um milhão de pessoas vive com R$ 275 por mês apenas na Região Metropolitana de Porto Alegre.