SINDICATO DOS TRABALHADORES DO JUDICIÁRIO FEDERAL E MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO - FUNDADO EM 28 DE NOVEMBRO DE 1998 - FILIADO À FENAJUFE E CUT

FORÇANDO A PORTA

Lira diz que governo tem que discutir reforma administrativa por bem ou por mal ; frentes parlamentares de empresários e do agro foram mobilizadas

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), voltou a ameaçar o governo na tentativa de emplacar a reforma administrativa de Bolsonaro. Lira subiu o tom: Precisamos fazer que o governo entenda, por bem ou por mal, assim ou assado, que ele tem que entrar nessa discussão , disse.

A declaração foi dada durante almoço no qual o presidente da Câmara recebia um documento assinado por 23 frentes parlamentares em defesa da proposta de emenda à Constituição (PEC) 32/2020, da reforma administrativa. O Congresso tem hoje mais de duzentas frentes parlamentares e, entre as 23 que assinaram o manifesto, há algumas presididas pelo mesmo deputado, que assinou em nome de todas elas. Isso não muda o fato de que há uma mobilização capitaneada por Lira entre deputados. O manifesto pede que seja discutido o tamanho do Estado brasileiro, sem disfarçar que sua proposta é de Estado mí­nimo. O texto defende que seja feita economia por meio da diminuição do tamanho da máquina administrativa . Veja aqui a í­ntegra.

Nos últimos meses, Lira tem percorrido entidades empresariais em articulações pela PEC 32. Representante dessa agenda no Congresso, ele tem pedido aos empresários que pressionem o governo Lula (PT), que desde a campanha eleitoral tem se afirmado contrário à proposta. Dessa vez, não foi diferente. Em sua declaração, Lira reiterou o pedido por novos gestos do setor empresarial e disse que se houver pressão suficiente o texto pode ser aprovado, conforme matéria do jornal Valor Econômico. Ou seja: Lira, que incorpora os interesses do mercado financeiro como agente público, quer dos empresários que estes se movimentem em torno da pauta que eles próprios querem ver avançar.

Por outro lado, o ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, declarou durante entrevista ao programa Roda Viva, que foi ao ar na noite do dia 24, que a proposta da reforma administrativa (PEC 32/2020) que está na Câmara representa a destruição do serviço público . O ministro foi incisivo: Aquilo que foi feito pelo governo anterior, pelo ministro Paulo Guedes, eu nem chamo de reforma , disse.

Ataque a concursos públicos, estabilidade e precarização

Se para os servidores a PEC 32 é uma tragédia, para a população é muito pior. Na prática, a proposta acaba com concursos públicos e substitui servidores que ingressam pela porta da frente por contratos temporários de até 10 anos, facilitando a entrada de apadrinhados nos municí­pios, estados e na União, piorando a qualidade dos serviços públicos e multiplicando cabides de emprego para cabos eleitorais.

Lira quer aprovar a PEC 32 para mudar os regimes de contratações para rebaixar salários e ao mesmo tempo reforçar nacionalmente a privatização e terceirização de serviços básicos como a saúde e a educação através de Organizações Sociais ou diretamente para empresas, como já ocorre em diversos municí­pios brasileiros.

A reforma administrativa afeta servidores e servidoras das três esferas, dos três poderes, atuais e novos, da ativa e aposentados. Mesmo que, em um primeiro momento, somente os novos não teriam direito à estabilidade, os atuais servidores e servidoras seriam submetidos a avaliações de desempenho que poderiam, por exemplo, ser negativadas por participação em greves ou por perseguições polí­ticas. Importante lembrar que a atual legislação já prevê a demissão de servidores e servidoras estáveis, mas a PEC 32/2020 inclui ferramentas que favorecem a pressão, o assédio e a ameaça nos locais de trabalho. Os atuais aposentados e pensionistas que têm direito a paridade e integralidade também seriam atingidos, pois estariam vinculados a carreiras em extinção.

Extinção da Justiça do Trabalho, ataque à Previdência, congelamento de salários e reforma trabalhista: quem são alguns dos signatários do manifesto?

Alguns dos principais signatários do manifesto têm longo histórico de ataques aos direitos dos trabalhadores e das trabalhadoras, aos serviços públicos e ao Judiciário. Seu apoio à reforma, portanto, nada mais é do que uma renovação a suas posições favoráveis à agenda que foi derrotada nas eleições do último ano.

O manifesto é assinado, entre outros, pelo presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), deputado Pedro Lupion (PP-PR); o presidente da Frente Parlamentar do Empreendedorismo (FPE), Joaquim Passarinho (PL-PA), o presidente da Frente Parlamentar pelo Brasil Competitivo, Arnaldo Jardim (Cidadania-SP); e o presidente da Frente Parlamentar de Comércio e Serviços, Domingos Sávio (PL-MG).


Joaquim Passarinho (PL-PA) tem, em seu histórico recente na Câmara, votos a favor da reforma trabalhista de 2017, da reforma da Previdência de 2019, do teto de gastos e do congelamento de salário de servidores públicos durante a pandemia. Ele também assinou a proposta de emenda à Constituição do deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PL-RJ) para acabar com a Justiça do Trabalho e o Ministério Público do Trabalho (MPT).

Perfil do deputado traçado pelo site De Olho Nos Ruralistas conta que Passarinho é o autor do PL 6432/2019, que autoriza empresas a comprarem ouro diretamente da atividade predatória, e que, com essa credencial, foi o escolhido pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para comandar o Grupo de Trabalho de Revisão do Código de Mineração (GT Minera) . Ainda conforme a reportagem, o parlamentar mantém uma relação próxima com Raul Jungmann, diretor do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), e com lobistas como José Altino Machado, o Zé Altino, e Dirceu Frederico Sobrinho. É também um interlocutor frequente de polí­ticos locais. Um deles, o deputado estadual eleito Wescley Tomaz (MDB-PA), tem acesso livre à alta cúpula do governo federal (Bolsonaro, à época). Conhecido como o ˜vereador dos garimpeiros™, Tomaz exercia mandato na Câmara Municipal de Itaituba (PA) . Suas relações vão além. A reportagem do De Olho Nos Ruralistas também conta que, em novembro do ano passado, Passarinho recebeu em seu gabinete na Câmara o terrorista George Washington de Oliveira Sousa, de 54 anos, que um mês depois tentaria explodir um caminhão com querosene perto do Aeroporto Internacional de Brasí­lia . E mais: Uma semana antes da visita, Passarinho esteve no quartel-general (QG) do Exército, na capital federal, e posou para fotos ao lado de golpistas. ˜Todos juntos pela democracia e pelo Brasil™, escreveu .


Quem também assinou a PEC para acabar com a Justiça do Trabalho e o MPT foi o deputado Domingos Sávio (PL-MG), outro signatário do manifesto pela reforma administrativa. Ele é outro que votou a favor da reforma trabalhista, da reforma da Previdência, do teto de gastos, do congelamento de salário de servidores públicos durante a pandemia e da MP da Liberdade Econômica , uma espécie de minirreforma trabalhista que, entre outras medidas, removeu barreiras para o trabalho aos domingos.

Sávio está na lista de parlamentares da Câmara e Senado que receberam recursos de empresários com terras sobrepostas a terras indí­genas, de acordo com o relatório elaborado pela ONG De Olho nos Ruralistas


Também signatário do manifesto, Pedro Lupion (PP-PR) é deputado desde 2019, de forma que não estava na Câmara para votar nos ataques que o governo de Michel Temer (MDB) desferiu contra a população. Mas estava, sim, para votar a favor da reforma da Previdência de Bolsonaro e do congelamento de salário de servidores e servidoras durante a pandemia. Também votou a favor da Medida Provisória da Liberdade Econômica .

Para se eleger, Lupion teve entre seus doadores de campanha Cirineu de Aguiar, sócio da Agropecuária Calupa Ltda. Conforme reportagem do site De Olho Nos Ruralistas, a empresa é a dona da Fazenda São Tomé, que tem a totalidade de seus 2.500,83 hectares sobrepostos à TI [terra indí­gena] Apiaká do Pontal e Isolados, no municí­pio de Apiacás (MT) . A mesma reportagem aponta que Lupion é filho do ex-deputado federal Abelardo Lupion, fundador da União Democrática Ruralista (UDR) do Paraná; e bisneto do ex-governador do estado Moysés Lupion, responsável por um dos maiores esquemas de grilagem da história brasileira. Em entrevista ao Brasil de Fato, a professora Regina Bruno, da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRJ), aponta que os integrantes da UDR têm perfil conservador, são contrários à garantia de direitos àqueles que divergem dos seus interesses e agem em sintonia com as bancadas da bala e da bí­bliaque representam no Congresso, respectivamente, o lobby militarista e fundamentalista cristão .


Deputado desde 2007, Arnaldo Jardim (Cidadania-SP) não esteve nas votações da reforma trabalhista e do teto de gastos, mas, como seus colegas de manifesto, votou a favor da reforma da Previdência, do congelamento de salário de servidores públicos durante a pandemia e da MP da Liberdade Econômica

O mesmo Cirineu de Alencar que contribuiu com a campanha de Pedro Lupion também doou para a campanha de Jardim sócio da Agropecuária Calupa, empresa proprietária da Fazenda São Tomé, em Mato Grosso, que sobrepõe mais de 2,5 mil hectares das terras indí­genas Apiaká do Pontal e Isolados.