SINDICATO DOS TRABALHADORES DO JUDICIÁRIO FEDERAL E MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO - FUNDADO EM 28 DE NOVEMBRO DE 1998 - FILIADO À FENAJUFE

URGENTES SÃO OS SERVIÇOS PÚBLICOS

Novo regime fiscal, gatilhos e amarras põem em risco reposições de perdas acumuladas e a revisão da carreira

Reposições de perdas salariais acumuladas para servidores e servidoras públicos federais, a reestruturação da carreira e a nomeação de cargos vagos estão ameaçados se o projeto de novo regime fiscal (PLP 93/2023) for aprovado como está. Quem adverte é o consultor legislativo Luiz Alberto dos Santos, que tem ampla experiência em pesquisa e análise sobre o tema e tratou da questão em palestra durante o Encontro de Carreira da Fenajufe no último domingo, 21, e também no artigo “O substitutivo ao projeto de lei complementar nº 93, de 2023, e a despesa com pessoal: ajuste fiscal permanente e sucateamento da administração pública”.

Gatilhos podem travar mudança em carreiras

O projeto original já previa que, em caso de não cumprimento da meta fixada pela Lei de Diretrizes Orçamentárias, em vez de 70%, os gastos só poderiam crescer o equivalente a 50% da variação da arrecadação. Mas o parecer do relator, deputado Cláudio Cajado (PP-BA), incluiu diversos gatilhos que se somam a essa limitação. A pressão do “mercado” é por mais travas, na medida em que não há certeza no aumento da arrecadação. Conforme o texto, no primeiro ano de descumprimento, o governo não poderá criar cargos que impliquem aumento de despesa, alterar estruturas de carreira, criar ou aumentar auxílios, criar novas despesas obrigatórias, reajustar despesas obrigatórias acima da inflação, ampliar subsídios e subvenções e conceder ou ampliar benefícios tributários. Além disso, a despesa só crescerá 50% da variação real da receita do ano anterior, como já previa o projeto original. As medidas valem por um ano. Se no ano seguinte a meta for atingida, elas deixam de valer. Mas se não for, voltam mais duras no segundo ano, com novas vedações, como concessão de reajuste a servidores e servidoras, admissão ou contratação de pessoal e realização de concursos públicos, exceto para reposições de vacância. As mesmas proibições serão aplicadas se as despesas obrigatórias ultrapassarem 95% das despesas primárias.

Quadro geral da categoria

Em sua palestra, Luiz Alberto dos Santos apresentou um panorama geral da categoria e de seus diferentes cargos, classes e padrões. Como se vê abaixo, há predominância de técnicos, mas com número bastante significativo de analistas; também há, conforme dados referentes a dezembro de 2022, quase 30 mil aposentados e aposentadas, que devem ser considerados sempre que se fala em questões de carreira e remuneração.


Já no quadro abaixo vemos a distribuição da categoria de acordo com classes e padrões, relacionada também aos diferentes cargos. Grande parte dos colegas ativos está na parte final da carreira, tanto no caso dos técnicos quanto dos analistas.


Mais de 20% de perdas acumuladas em fevereiro de 23; no governo Bolsonaro, foram quatro anos sem reposição

Os dados apresentados por Luiz Alberto dos Santos demonstram que, mesmo com a reposição salarial parcial conquistada pela categoria no final do ano passado, apenas de janeiro de 2019 a janeiro de 2023 são 27,6% de perdas. Mas, em fevereiro, ao receber a primeira parcela da reposição, os salários foram reajustados em apenas 6%, restando mais de 20% de defasagem. As perdas acumuladas se devem, em especial, ao fato de a categoria ter ficado quatro anos sem nenhuma reposição salarial, graças à política de congelamento conduzida por Bolsonaro.

E a situação pode ser agravada na sequência, mesmo que as previsões de inflação para o próximo período se confirmem – o que, conforme o especialista, não costuma ocorrer, com índices em geral superiores aos previstos. Conforme o consultor legislativo, o reajuste de 6% previsto para fevereiro de 2024 será insuficiente até mesmo para recompor as perdas de 2023, projetadas em 6,03%. Em janeiro de 2025, após aplicado o reajuste de 6% em fevereiro de 2024, a projeção geraria perdas acumuladas de 24,62%. “Assim, ano a ano, mais de 1/5 do poder aquisitivo dos servidores do Poder Judiciário terá sido suprimido”, adverte Luiz Alberto dos Santos.



Pouca margem para novas despesas

Luiz Alberto dos Santos aponta que, com o novo regime fiscal – assim como com a manutenção do atual teto de gastos – haverá pouca margem para acomodar novas despesas, o que fará com que reposições salariais tenham de disputar um orçamento bastante enxuto com diversos outros gastos. Nos últimos 25 anos, explica, o crescimento da arrecadação foi muito pequeno comparativamente ao que o governo estima necessário para atingir as metas fiscais. Sem atingir as metas, automaticamente serão acionados os gatilhos. Mas, mesmo que as atinja, a limitação do crescimento dos gastos a 2,5% de aumento real cria essa disputa pelo orçamento, potencializada pelo fato de que as exceções ao teto foram reduzidas pelo relator.

O projeto prevê que todos os gatilhos também sejam aplicados se as despesas obrigatórias ultrapassarem 95% das despesas primárias. Luiz Alberto dos Santos demonstrou que esse limitador também pode engessar o orçamento: “se a gente examinar à luz da emenda constitucional 109, aquele teto de 95% das despesas primárias – as obrigatórias não podem ultrapassar 95% do total da despesa primária -, a gente observa que, no conjunto do orçamento da União, já estamos em 90 ou 91%, dos 95. Uma folguinha de quatro pontos percentuais para acomodar todas as demandas e necessidades sujeitas ao teto de gastos”.

Esse mecanismo está estabelecido não só na EC 109, mas também no PLP do novo regime fiscal, em seu artigo 8º: “Quando verificado, relativamente ao exercício financeiro anterior, que, no âmbito das despesas sujeitas aos limites de que trata o at. 3º desta Lei Complementar, a proporção da despesa primária obrigatória em relação à despesa primária total foi superior a 95% (noventa e cinco por cento), aplicam-se imediatamente as vedações previstas nos incisos I a IX do art. 167- A da Constituição Federal”, diz o texto. As vedações são as mesmas previstas nos gatilhos já descritos.

Nesse cenário, analisa Santos, há pouca margem para acomodar novas despesas. O consultor explica que, analisando o cenário com base no passado recente e nas próprias expectativas que o governo tem apresentado, o crescimento real para 2024, no caso do Poder Judiciário, é muito pequeno, “não dá para praticamente nada”.

Uma das reivindicações atingidas, além da reposição das perdas acumuladas, é a correção da distorção da remuneração entre técnicos e analistas judiciários. Em um exemplo no qual a correlação entre técnicos e analistas seria de 70%, o custo para os cofres públicos seria de R$ 2 bilhões, o que também poderá ser inviabilizado pelo regime fiscal e seus limitantes. O mesmo tipo de raciocínio vale para outras alternativas, como a sobreposição de tabelas e o aumento do adicional de qualificação.

Urgente é a reconstrução dos serviços públicos! O orçamento deve estar a serviço do povo brasileiro!

O especialista defende ainda que será necessário reabrir negociações sobre reajustes em 2024 e 2025, tendo-se em conta a crescente defasagem e que o limite temporal para implementação de qualquer reajuste é junho de 2026, por conta das eleições para o Executivo e das limitações impostas pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Porém, para que essa reposição seja viável, é necessária outra lógica fiscal. É apontando nesse sentido que o mesmo Encontro de Carreira da Fenajufe no qual Santos palestrou aprovou resolução defendendo que “a reconstrução dos serviços públicos não pode ter amarras e tampouco ficar presa à ‘sustentabilidade da dívida’, turbinada pela taxa de juros” e que “a prioridade do orçamento deve ser as demandas da população!”: “As medidas corretas tomadas pelo governo, como a retirada de empresas da lista de privatizações, o aumento real do salário mínimo, a correção da faixa de isenção do imposto de renda, a redução dos preços dos combustíveis, são positivas e devem ser aprofundadas. Contudo, o projeto de novo regime fiscal vai noutro sentido. A reconstrução dos serviços públicos não pode ter amarras e tampouco ficar presa à ‘sustentabilidade da dívida’, turbinada pela taxa de juros”, diz a resolução.