Entidades empresariais ligadas aos setores de varejo e de serviços estão ampliando a pressão sobre o Congresso e o governo por uma reforma administrativa com itens muito semelhantes à proposta de emenda à Constituição (PEC) 32/2020, apresentada pelo governo de Jair Bolsonaro (PL) e nunca votada em plenário. Há alguns itens até mesmo piores do que os da PEC. Mas a principal novidade – e um novo risco – é que a estratégia agora é enxertar os itens em diferentes projetos de lei já em tramitação.
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As entidades, que incluem, por exemplo, a Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), estão reunidas no Fórum Empresarial de Modernização do Estado. Neste momento, buscam novas assinaturas do empresariado para uma carta aberta em defesa da reforma. Ao mesmo tempo, vêm atuando junto ao Congresso e contando com o apoio de setores da imprensa para legitimar e divulgar suas intenções – também uma forma de gerar movimentação em torno do tema na opinião pública. Elas contam também com grupos de parlamentares que ideologicamente já estão afinados com esse tipo de agenda, como os que integram a Frente Parlamentar do Livre Mercado, que utiliza estruturas do “Instituto Livre Mercado”, entidade privada que diz ter como missão “influenciar as decisões do Congresso Nacional para que sejam mais favoráveis à liberdade econômica”
O conteúdo da proposta das entidades está disponível em seus espaços de divulgação e inclui 15 itens centrais. Eram 14 quando da divulgação de reportagens na imprensa, em veículos como a Folha de S. Paulo e o Estado de Minas, mas foi introduzido um ponto sobre “modernização dos concursos públicos”, com provas online e “inserção de novos critérios de seleção”.
Os pontos não são detalhados na carta, mas apontam as intenções gerais das entidades e sugerem a ameaça que representam. Eles incluem, por exemplo, a restrição da estabilidade para carreiras “ameaçadas de perseguição política”, desconsiderando toda a importância da estabilidade para o próprio funcionamento e impessoalidade dos serviços públicos oferecidos à população e deixando para os governantes e cúpulas de plantão o poder sobre a ocupação dos cargos públicos. Incluem também a demissão “por baixo desempenho”, ou seja, vinculando a manutenção de cargos à pressão das metas, levando ao serviço a lógica perversa do setor privado.
A proposta dos empresários também defende a possibilidade de redução temporária de salários em situações “como epidemias ou fortes restrições fiscais”. Dessa forma, se essa proposta já estivesse em vigor na pandemia de covid-19, servidores e servidoras teriam tido seus salários reduzidos. Além disso, não fica claro o que seriam “fortes restrições fiscais”, de maneira que qualquer alegado desequilíbrio poderia servir como pretexto para reduzir salários. Há também propostas que buscam legitimar socialmente o pacote de medidas como “a proibição de supersalários”, justamente o que o Congresso se recusa a acabar mesmo sabendo que a maior parte da magistratura recebe muito mais do que o máximo estabelecido pela Constituição (R$ 44.008,52) segundo levantamento feito pelo portal Uol no ano passado.
Entre outros pontos, a “reforma administrativa” defendida pelas entidades empresariais, sem que sejam apresentados detalhes, também propõe mudanças na regulamentação do estágio probatório, redução de salários iniciais e programas mais lentos de progressão, introdução de novos sistemas de avaliação, definição de ações para reformas administrativas estaduais e municipais e definição de promoções ao limite de 5% do total de pessoas em cada carreira a cada ciclo avaliativo.
Foto: Beto Vasconcelos/Sescon-SP