Nos últimos anos, algumas das grandes empresas de tecnologia – e, depois, operadoras do mercado financeiro – adotaram uma nova política de férias: não ter política de férias. O que parece atrativo para os trabalhadores e as trabalhadoras quando chamado de “férias infinitas” na verdade esconde armadilhas que podem gerar o aumento da exploração do trabalho pelas empresas e a redução dos períodos de descanso.
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A nova política foi adotada recentemente pela Microsoft nos Estados Unidos, mas já vinha sendo usada por empresas como Netflix, LinkedIn e Goldman Sachs. E chegou também à indústria, como é o caso da General Electric. É simples: os trabalhadores podem tirar quantos dias de férias quiserem por ano, desde que em acordo com as chefias diretas e garantindo a produtividade.
Nos Estados Unidos, a legislação é bastante permissiva para as empresas, com poucos direitos garantidos para trabalhadores e trabalhadoras. Sequer férias remuneradas são garantidas para todos, dependendo de legislações locais ou de decisões de cada empresa. Algo semelhante ao caminho que a reforma trabalhista de 2017 (lei 13.467/2017) apontou para o Brasil e que vem gerando uma agressiva precarização do trabalho, cenário que o governo de Jair Bolsonaro (PL) tentou – e, em alguma medida, conseguiu – agravar.
As consequências das “férias infinitas” são graves. Após muitos se iludirem com a aparente liberdade, deparam-se com uma realidade de pressões objetivas ou subjetivas para que não tenham períodos de descanso. As pressões podem ser de chefias, colegas ou até mesmo do próprio trabalhador, que se sente culpado por não estar trabalhando. Além disso, os tempos de trabalho e de descanso confundem-se e misturam-se, não permitindo um real afastamento da lógica produtivista.
Reportagem da BBC sobre o tema cita pesquisas que demonstram que trabalhadores com “férias infinitas” ou “ilimitadas” acabam tirando menos férias do que os demais. Outra pesquisa aponta ainda que um terço dos trabalhadores estadunidenses com “férias ilimitadas” sempre trabalha no período de férias. A reportagem cita ainda casos de empresas que aderiram a essa política mas acabaram recuando por perceber que os funcionários estavam tirando menos dias de férias: “o CEO da empresa de recursos humanos Unknown, com sede em Londres, viralizou em uma postagem no LinkedIn explicando que a empresa cancelou seu programa de férias remuneradas ilimitadas porque as pessoas se sentiam culpadas e nunca tiravam dias de descanso. Agora, a empresa oferece 32 dias de descanso remunerado, para funcionários de todos os níveis”, conta a reportagem.
A permissividade de legislações trabalhistas que deixam margem para esse tipo de política deixa trabalhadores e trabalhadoras reféns das empresas, restando apenas torcer por patrões que se preocupem com os funcionários. Mas a realidade, que tem sido vista no Brasil em outras questões após a reforma de 2017, é que a tendência é de que os “acordos” sejam, na prática, imposições das empresas sobre trabalhadores que necessitam dos empregos, gerando precarização, perda de direitos e superexploração do trabalho. A única forma de coibir de fato essa política é garantir legislações protetivas, que definam e ampliem os direitos dos trabalhadores e das trabalhadoras frente à impositividade truculenta do capital.
Leia AQUI a matéria da BBC.