SINDICATO DOS TRABALHADORES DO JUDICIÁRIO FEDERAL E MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO - FUNDADO EM 28 DE NOVEMBRO DE 1998 - FILIADO À FENAJUFE E CUT

Saúde

Eu diria que estamos vivendo um tempo de miséria e barbárie , analisa pesquisadora na palestra final da jornada de formação do Sintrajufe/RS

Na quarta-feira, 2, o Sintrajufe/RS encerrou a jornada de formação A saúde dos trabalhadores e trabalhadoras ameaçada: trabalhar, sim, adoecer, não , que contou com uma série de seis encontros e que se iniciou em 29 de abril. O tema dessa quarta foi Desejar, falar, trabalharconfrontar as armadilhas do controle e da subalternidade no trabalho e teve como painelista convidada a psicóloga, pesquisadora e professora da UnB Ana Magnólia Mendes.

O painel foi apresentado pelo diretor do Sintrajufe/RS José Carlos de Oliveira e mediado pela diretora Márcia Coelho e pelo diretor Paulo Oliveira. Mara Weber, diretora e uma das organizadoras do evento, fez uma participação com as palavras finais.

José Oliveira iniciou a apresentação fazendo um apanhado dos conteúdos da jornada e uma homenagem ao médico do trabalho Rogério Dornelles, da assessoria de saúde do sindicato, falecido na última segunda, citado também por Mara Weber em seu encerramento.

Silêncio gritante que explode em sofrimentos

Ana Magnólia apresentou as linhas básicas de sua pesquisa, buscando apresentar o tratamento dado ao trabalhador dentro do discurso do capitalismo colonial. Ela falou sobre a percepção de dois sujeitos no ambiente de trabalho: o sujeito chamado a a criar, a pensar, a participar, a compartilhar e a existir e o sujeito chamado de de lento, de inábil de incapaz de cumprir metas, de socializar, de serum sujeito calado por várias vozes de opressão.

Segundo a painelista, interessa ao sistema apenas aquele que se adapta e adere voluntariamente a ele, reproduzindo seu discurso e colonizando os companheiros e companheiras. Um tipo normopata , adaptado, acelerado, indiferente, que banaliza o mal e a crueldade no ambiente laboral, com traços de sociopatia e psicopatia. Esse sujeito hiperadaptado veicula bem o discurso de opressão, servindo voluntariamente pela satisfação de sentir-se superior e prevalecer-se no abuso de poder.

Nós não temos que ter vergonha de sermos humanos, temos que ter vergonha de sermos máquina e de interagir com outros seres humanos de forma normopata ou sociopata, que é essa barbárie que está acontecendo hoje , pontua a professora e pesquisadora da UNB.

Paulo Oliveira assinalou que toda essa situação só se agrava no contexto atual. O teletrabalho representou uma ruptura da temporalidade, não há mais horário de expediente. Os trabalhadores que estão na produção vão sendo precarizados, vários demitidos, horários alterados. E se juntam a tantos medos, o medo da solidão. Como vamos processar isso, como nos mobilizar como sindicato? , questionou. Vejo esse trabalhador lutando, mais que por seus direitos, pela manutenção da própria relevância.

Segundo Ana Magnólia, o que impede o trabalhador de oferecer resistência a esse sistema é a satisfação de suas emoções primárias, a satisfação de sua ferida narcí­sica, a necessidade de reconhecimento. E, com isso, entra cada vez mais na tentativa de suprir uma demanda por um modelo ideal de perfeição que é impossí­vel de conseguir. O capital vem usando o medo, a solidão e a incerteza, que são emoções muito primárias para o ser humano, como instrumentos de controle. O sujeito fica muito acuado. Estamos em uma disputa muito assimétrica de poder, onde o medo, a insegurança e a ansiedade são instrumentos de gestão.

Nesse contexto, ela enfatiza a necessidade da insistência, da persistência. A informatização dos processos já não é mais uma ameaça, é uma realidade. Tudo mudou e é necessário criar modos totalmente novos de mobilização .

A diretora Márcia Coelho ratificou o quanto essa consciência e esses conceitos são importantes para o momento atual do movimento sindical: são conceitos e subsí­dios para a gente encaminhar a luta, estudar e, em cima desses conceitos psicanalí­ticos, moldarmos uma nova luta. A luta que existia já não estava dando resultados, mas tudo se agravou nesse momento de pandemia, em que não há uma aproximação entre os colegas. Você trouxe estratégias para oxigenar nosso trabalho e nossa dedicação para melhorar as condições como sindicalistas e como servidores e servidoras do Judiciário. E a indicação da necessidade de um novo encontro, porque o assunto não se esgotou .

Um processo colonial particular

Perguntada pelo público se a subalternidade era um processo exclusivo do Brasil, a pesquisadora respondeu que é provável que não, mas é inegável que temos certas especificidades. É a única história de colonização do mundo onde colonizadores e colonizados viveram juntos. Então, têm algumas feições da nossa história de colonização que se repetiram nas instituições. Acredito que esse processo que não é contado nos livros é muito singular da nossa história, comparado a outros paí­ses da América Latina e da áfrica. Ana Magnólia disse que, com base na sua experiência ouvindo queixas de trabalhadores adoentados, percebeu que esse processo não é só psicológico ou fí­sico, mas também histórico e social.

Concluindo a jornada

A diretora Mara Weber lançou as palavras finais que marcaram o norte desta jornada, agradecendo essa generosa rede de pensadores de esquerda que pensam o mundo do trabalho, que pensam saí­das, que pensam refazer o caminho da nossa narrativa histórica para que a gente possa construir uma saí­da para a classe trabalhadora, um projeto civilizatório mais generoso, que é o que pretendemos. Esse foi um dos nossos objetivos, em parceria com outras categorias, porque mesmo que tenhamos especificidades, a fonte da opressão vem da mesma origem. O controle e a organização do trabalho que o neoliberalismo colonial nos impõe é muito semelhante para todos, o controle e a captura da subjetividade, a escravidão, a servidão voluntária. A jornada teve esse objetivo, de trazer esses pensadores de várias áreas para que se juntem à práxis do movimento sindical, para que possamos construir saí­das para esse momento, saí­das generosas de trabalho vivo.

Todos os eventos da jornada foram transmitidos pelo canal do YouTube do Sintrajufe/RS e Facebook do sindicato. Entidades parceiras também fizeram a divulgação e/ou retransmissão de cada painel.

Entidades parceiras:

TRT4 e Escola Judicial do TRT4
Fenajufe (Judiciário Federal e MPU) e Fenajud (Judiciário Estadual)
CUT/RS, CUT/MT, CUT Regional Centro RS (Santa Maria e região) e FSST
Sindicatos do Judiciário Federal/MPU: Sindjuf/PA-AP, Sintrajuf/PE, Sisejufe/RJ, Sintrajusc/SC e Sindiquinze/SP
Sindicatos do Judiciário Estadual: Sindjustiça/GO, Sindijus/PR e SinjuSC/SC
Sindicatos de outras categorias: Assufsm, Cpers/RS, Semapi/RS, Sindiágua/RS, Sindipetro/RS, Sindjor/RS, APP Sindicato (educação pública do Paraná) e SINTEP/MT