SINDICATO DOS TRABALHADORES DO JUDICIÁRIO FEDERAL E MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO - FUNDADO EM 28 DE NOVEMBRO DE 1998 - FILIADO À FENAJUFE E CUT

AGROECOLOGIA

Em live do Sintrajufe/RS sobre agroecologia, debatedores falaram sobre os danos à saúde e ao meio ambiente causados pelos agrotóxicos

Na segunda-feira, 8, o Sintrajufe/RS promoveu a live Agrotóxicos x agroecologia: vida, saúde e sustentabilidade . Participaram a médica do trabalho e integrante da assessoria de saúde do Sintrajufe/RS Virginia Dapper e o agrônomo e coordenador adjunto do Fórum Gaúcho de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos, Leonardo Melgarejo. Ambos falaram sobre os danos à saúde, ao meio ambiente decorrentes causados pelos agrotóxicos, assim como a degradação do planeta como um todo. A atividade foi a primeira promovida pelo Projeto Agroecologia, lançando pelo sindicato em setembro.

A mediação do evento ficou a cargo da diretora do Sintrajufe/RS Mara Weber. Na abertura do evento, a dirigente disse que as crises climática, hí­drica e de alimentos não são questões aleatórias. A gente vive um momento de fome no Brasil, agravada pela pandemia, e um governo que tem o objetivo de ˜passar a boiada’, que significa a grilagem na Amazônia, a produção cada vez maior de agrotóxico, fim de apoio à agricultura familiar, para a pesquisa em agroecologia , enfraquecimento do sistema de fiscalização. Há esforço do capitalismo de vender a possibilidade de capitalismo verde , mas, ressaltou, Mara, no nosso entender, essa possibilidade não existe, pois o capitalismo precisa crescer sem limite, viver e se desenvolver pelo consumismo e tem, cada vez mais, criado fome, miséria, destruição e morte .

Mara falou também sobre a PEC 32/2020, de reforma administrativa, que significa a destruição do serviço público, o qual é fundamental, seja na pesquisa, seja na fiscalização, para garantir polí­ticas de desenvolvimento que pensem o meio ambiente e a saúde. Na avaliação da diretora do sindicato, a agroecologia é uma pauta de construção social e cultural , e o sindicato deve estar presente, em uma atuação em rede com outras entidades, para levar à categoria discussões, debates, informações sobre produção e consumo de alimentos.

Número de agrotóxicos mais que dobrou em quatro anos no Brasil

A médica Virginia Dapper, que trabalha também no atendimento a agricultores na região noroeste do Rio Grande do Sul, relatou que, entre 2010 e 2015, foram registrados 815 agrotóxicos no Brasil; entre 2016 e 2020, o número mais que dobrou. Nesse perí­odo, foram registrados 2.010 agrotóxicos, 906 deles apenas nos dois primeiros anos do governo Bolsonaro.

Em 2020, no Brasil, 1 milhão de toneladas de agrotóxicos foram despejadas nas lavouras. Virginia explicou que esse agrotóxico se dissemina, ou seja, bebemos água com resí­duo de agrotóxicos, não temos acesso a alimentos sem resí­duos. Ela disse que há uma falsa ilusão de ní­veis de tolerâncias. Um dos problemas é que, no Brasil, esses ní­veis são apontados individualmente, em relação a cada produto, mas, na prática, as pessoas são expostas a múltiplos produtos. O teto em relação ao ní­vel total, considerando a exposição a vários desses venenos, não consta na legislação brasileira.

Uma das mobilizações contra os agrotóxicos, é contra o projeto de lei 10.833, o chamado PL do Veneno , que altera o marco regulatório dos agrotóxicos, na contramão das normas protetivas à saúde e ao meio ambiente, sendo mais permissivo e negligente. Neste ano, o decreto 10.833/2021 assinado por Jair Bolsonaro (sem partido), incorporou que há de pior no PL do Veneno.

Virginia mostrou diversas informações sobre a relação entre agrotóxicos e saúde ou adoecimentos. Entre 2007 e 2017, o Ministério da Saúde registrou 40 mil casos de intoxicações agudas por agrotóxicos e 1.900 mortes. As notificações por intoxicação por agrotóxicos mais que triplicaram na comparação de 2015 com 2018.

A Organização Mundial da Saúde estima que de 3% a 7% dos trabalhadores e trabalhadoras expostos a esses produtos sofrem de intoxicação aguda anualmente. Segundo estudo feito do IBGE, cada 1 dólar gasto na compra de agrotóxicos pode custar 1,28 dólares em futuros gastos com a saúde de agricultores.

O Rio Grande do Sul é um dos campeões nacionais no uso de agrotóxicos, informou a médica. Ela explicou que a exposição crônica a esses produtos pode desencadear depressão e pode estar associada ao suicí­dio. No RS, a média anual de suicí­dios é 13, podendo chegar a 20 nas regiões agrí­colas, enquanto, a nacional é de 8 entre homens.

O estado também é associado a uma “epidemia de câncer , especialmente a região noroeste, registrando as maiores taxas no paí­s de mortes por neoplasias (quando o tumor se dá por crescimento do número de células). Há famí­lias que moram na plantação; o quintal da criança é a plantação, não tem pra onde correr”, afirma Virginia.

O problema afeta também quem consome os agrotóxicos, um efeito que pode ser longo prazo. Segundo a médica, há diversas doenças associadas, como vários tipos de câncer, Doença de Parkinson e outras. Virginia disse que estudos apontam para diferenças nutricionais relevantes no consumo de orgânicos, incluindo valores mais altos de antioxidantes, redução do risco para doenças alérgicas, câncer, malformações e obesidade. Segundo a médica, muitas vezes, não é possí­vel não consumir os alimentos com agrotóxicos, mas as pessoas têm o direito de saber o que estão consumindo .

É preciso construir espaços de articulação e conscientização contra os venenos e em defesa da vida

O engenheiro agrônomo Leonardo Melgarejo começou sua fala trazendo três conceitos, que articulados, ajudam a entender a importância da preservação da vida não apenas humana, mas dos seres vivos do planeta e a busca por harmonia e equilí­brio nessa convivência.

O primeiro conceito é o holobionte, que significa que ninguém é uma coisa só ou está só, mas todos e todas fazem parte de uma comunidade interativa, que há no planeta uma articulação entre indiví­duos de reinos diferentes, por exemplo, animais e bactérias.

O segundo conceito é o sindemia, que combina sinergia com pandemia e traz ideia de superposição de pressões pandêmicas. Um exemplo dado por Melgarejo é o Brasil atual, no qual há pessoas morrendo por Covid-19, de intoxicação por agrotóxico, de fome, se matando por falta de emprego, por desespero . O terceiro conceito é o de colonização epistemológica e diz respeito a organizações muito grandes e poderosas que estão definindo o que é e não é verdade e têm interesse em se apoderar de bens comuns, como água, terra , e tentam nos manter sem informações e facilmente controlados.

Melgarejo retomou um exemplo da fala de Virginia Dapper, aquele 1 bilhão de toneladas de agrotóxicos despejados na lavoura. Ele explicou que, assim como a água, esse produto não desaparece, mas acaba sendo retido, em um processo lento de renovação, em algum lugar, possivelmente nas fontes de água, que vai sendo absorvido por diversos organismos vivos. Portanto, o acúmulo de veneno dentro desses organismos, incluindo o corpo humano, é crescente.

Ele deu como exemplo o glifosato, amplamente utilizado na agricultura no Brasil. Esse veneno cria um cí­rculo vicioso de plantas super-resistentes, que não morrem com determinados venenos. E, por fim, as plantas acabam virando pragas umas para as outras. Como é muito caro criar novos venenos para combater essas novas plantas, o resultado é a pressão para que os legisladores acabem liberando o uso de antigos venenos, proscritos em outros paí­ses.

Seguindo a ideia de holobionte, Melgarejo mostrou como as queimadas, a destruição, a homogeneização dos territórios, fazem com que doenças que estavam contidas em nichos ecológicos, em equilí­brio com seus organismos, dentro de cada um dos biomas, extravasem para o que sobra do espaço e, dessa forma, essas patologias atingem um número cada vez maior de pessoas, em diferentes paí­ses, de forma cada vez mais rápida. Cada um de nós é um, mas na verdade cada um de nós é uma parte , afirmou o engenheiro agrônomo.

Melgarejo questiona: como pode um sistema de desenvolvimento ser considerado bem-sucedido quando elimina milhões em benefí­cio de poucos milhares? . Para ele, a concepção epistemológica age de forma a deixar as coisas como estão, é uma forma de controle, um discurso que age contra nós . Por isso, afirma, precisamos acordar , ou seja, precisamos despertar para o fato de que estamos sendo tratados como cobaias , pois a poluição chegou ao genona, e estão destruindo nossa capacidade de enfrentar os problemas .

Ele afirma que médicos, pesquisadores sérios estão sendo excluí­dos dessas discussões, deixando de ser escutados em seus estudos, questionamentos. Na avaliação de Melgarejo, há urgência em trabalhar em redes, aprender com a natureza que não existe “espécie campeã”, que é preciso construir e fortalecer espaços de articulação para conscientização, buscar a saúde da sociedade, levar informações, em busca de solidariedade, complementaridade, que são os princí­pios da agroecologia.

No dia 12, live marca lançamento de dossiê contra o pacote do veneno

Nesta sexta-feira, 12, às 19h, será lançado o Dossiê contra o pacote do veneno e em defesa da vida . A atividade será mista, presencial e online, e contará com retransmissão do Sintrajufe/RS. Falarão sobre o material e a campanha contra os agrotóxicos Leonardo Melgarejo e álvaro Delatores, dirigente estadual do MST/RS.