SINDICATO DOS TRABALHADORES DO JUDICIÁRIO FEDERAL E MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO - FUNDADO EM 28 DE NOVEMBRO DE 1998 - FILIADO À FENAJUFE E CUT

DESTAQUE

Em live do Sintrajufe/RS, economistas afirmam que congelamento e redução de salário de servidores não são solução para crise

O Sintrajufe/RS promoveu, no dia 30, live para debater as propostas do governo Bolsonaro de congelamento de salários do funcionalismo (projeto 39/2020, aprovado no Senado no dia 2) e privatizações em meio à crise sanitária do novo coronaví­rus (plano A reconstrução do Estado ). Participaram o assessor da Fenajufe e ex-assessor parlamentar do Diap, Antônio Augusto de Queiroz; a economista e pesquisadora da Unicamp Marilane Teixeira; e o economista e professor da Unifesp Alberto Handfas. A mediação ficou a cargo do diretor do sindicato Zé Oliveira.

Deputados federais se pronunciam contra o congelamento de salários

Durante a live, os deputados federais gaúchos Pompeo de Mattos (PDT) e Elvino Bohn Gass (PT) fizeram uma breve participação, falando sobre a proposta de congelamento de salários. Pompeo afirmou que o governo Bolsonaro ataca o serviço público sob todos os aspectos, tudo o que é público ele tem ojeriza . Afirma que o PDT tirou posição de votar contra a proposta de congelamento e concluiu: o servidor não pode servir de bode expiatório, o servidor não é problema, mas solução .

Bohn Gass diz concordar sobre a importância dos servidores e afirma que irá rechaçar qualquer ataque ao funcionalismo. Para ele, enquanto o ministro da Economia, Paulo Guedes, foca no ajuste fiscal, deixa de falar onde está o problema, que, para o parlamentar, é o lucro dos banqueiros, os grandes patrimônios e as grandes heranças que não pagam imposto. Ele defende, ainda, que é preciso discutir escalas progressivas de imposto de renda, pois o assalariado é o mais penalizado.

Conjuntura adversa

Antônio Augusto de Queiroz afirmou que “estamos vivendo uma conjuntura profundamente adversa” e enumerou: há uma pandemia, com isolamento social, a economia está paralisada, com risco de o PIB ter que queda de 6% a 8%, um governo profundamente disfuncional, inepto, insensí­vel, que aposta todas as suas fichas na crise e no impasse para justificar medidas de força. Em suma, segundo o debatedor, é uma tempestade perfeita .

É nesse cenário que trabalhadoras e trabalhadores do setor privado veem aprofundado um quadro de perda de renda e emprego anterior à pandemia. Houve uma reestruturação profunda nas relações de trabalho, com precarização na legislação e uso intensivo de plataformas digitais (que dão trabalho, mas não dão emprego e direitos). É um ambiente muito preocupante, e é nesse contexto que o governo vem com a ideia de retirar direitos dos servidores públicos , explica Antônio Augusto.

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), apresentou substitutivo ao projeto de ajuda a estados e municí­pios e, com isso, levou para a Lei de Responsabilidade Fiscal, de modo permanente, a suspensão de qualquer aumento de despesa com pessoal durante estados de calamidade autorizados pelo Congresso. No caso da pandemia da covid-19, determina a proibição, até 31 dezembro de 2021, de reajustes, progressões etc. Na avaliação de Antônio Augusto, foi um presente de grego , às vésperas do Dia do Trabalhador, e configura uma verdadeira perseguição a servidoras e servidores.

Maior crise do capitalismo dos últimos cem anos

Para o professor de Economia da Unifesp e diretor da Associação dos Docentes da mesma universidade Alberto Handfas, vivemos a maior crise dos últimos cem anos do capitalismo . As consequências dependerão de como a sociedade se organiza, se a opção é por defender o interesse da maioria ou se é cada um por si , com as empresas no comando.

De acordo com o professor, a maioria dos paí­ses, inclusive os ricos, desmantelaram seus serviços de saúde, em particular depois da crise de 2010. E os que mais cortaram verbas são o que mais estão sentindo as consequências da pandemia. No Brasil, sobretudo com a emenda constitucional 95/2016, que congela investimentos em áreas sociais, cerca de R$ 23 bilhões foram cortados da saúde nos dois últimos anos. As medidas de emergência, de forma geral, estão priorizando salvar bancos e grandes empresas. Ou seja, não resolvem o problema da maioria nem a falta de verbas para a saúde.

O economista destaca que a crise atual se difere de outras, pois há problemas de falta de renda da população e também de oferta, situação que se vê em guerras, quando não há dinheiro para comprar e não existem produtos para vender. Alberto explica que a economia global já estava desacelerando, ainda como reflexo da crise de 2008, 2010, e, com a pandemia, juntaram-se duas enormes crises .

Ele defende que apenas com uma drástica intervenção do Estado o problema será resolvido. Lembrou que os Estados Unidos somente se recuperaram na Segunda Grande Guerra quando o governo interveio, estatizou várias empresas, garantiu emprego e renda. A situação era outra, mas Alberto entende que, se não houver medidas profundas por parte do governo, a economia não vai voltar a funcionar e boa parte das empresas vai falir. No Brasil, aponta, a situação é mais dramática ainda , pois nem medidas mí­nimas estão sendo tomadas. O governo está salvando bancos; a renda mí­nima, aprovada contra a vontade do governo, é insuficiente; e muitos dos empréstimos a pequenas empresas e suplementações da saúde não saí­ram do papel. Para ele, o governo não quer resolver, está apostando no caos , a fim de forçar essas pessoas a voltarem para as ruas, arriscando saúde e vidas. Alberto vê que a única saí­da passa pelo fim do governo Bolsonaro.

Governo é incapaz de olhar para a realidade

O governo é absolutamente incapaz de conduzir, liderar um processo como esse , e joga com a vida e os sentimentos das pessoas, afirma Marilane Teixeira. Segundo ela, a agenda de austeridade econômica, de privatizações, mostra que o governo Bolsonaro é incapaz de olhar para a realidade. Ela ressalta que a crise causada pela pandemia chega em um contexto de fragilidade do ponto de vista do trabalhador, que vem sofrendo diversos ataques em seus direitos, e que não estávamos saindo da crise: todos os indicadores apontam que 2020 seria um ano de estagnação .

Para a economista, se não for efetivada uma polí­tica que busque salvaguardar a massa de trabalhadoras e trabalhadores que já está precarizada, a saí­da da crise vai ser muito dolorosa, longa e vai vitimar muito mais pessoas , seja pelo ví­rus, seja pela desestruturação das cadeias de produção. Ela defende que é necessária uma renda mí­nima que de fato atinja os precarizados e cujo valor possa, realmente, garantir condições dignas a essas pessoas e suas famí­lias. Para a professora, é preciso colocar dinheiro em circulação, reconstruir as cadeias da economia, repensar o papel do Estado e das polí­ticas públicas.

Ela ressalta que, sem renda, as pessoas não conseguem permanecer em casa; o isolamento está ameaçado porque as pessoas têm que sair para garantir a comida, o básico, pagar as contas. Esse governo faz de propósito quando minimiza a pandemia e cobra uma postura de que as pessoas têm que sair para trabalhar e garantir a economia , afirma Marilane, ressaltando que não tem dicotomia entre saúde e vida, não tem economia se não tem vida, a centralidade tem que estar na vida. E o Estado tem que estar a serviço daquilo que garante a vida .

Medidas para sair da crise

Para Alberto, distribuir renda para o trabalhador que está sem emprego é condição básica para sobrevivência e, com R$ 600, isso não é possí­vel. Ele concorda com Marilane e afirma que, na prática, o governo boicota o isolamento e talvez condene à morte muitas pessoas. O Brasil pode chegar a muitas mortes desnecessárias . De acordo com o professor, é mentira que não há dinheiro e precisa cortar salários dos servidores , pois a economia prevista com essas medidas é ridí­cula, não dá para nada . Além disso, ressalta, não se pensa que as famí­lias desses servidores vão deixar de consumir, reduz arrecadação de impostos.

Como medidas emergenciais para garantir renda e consumo e evitar uma quebradeira em cadeia da economia, ele afirma que não é necessário cortar gastos. Uma das alternativas, que não precisa de nova lei para ser colocada em prática, é a emissão de moeda, o pagamento pelo governo, a partir da conta única do tesouro (que tem em torno de R$ 1,3 trilhão), sem emissão de tí­tulos. Com isso, gira a economia e não aumenta a dí­vida pública. Neste momento, em que o consumo está parado, também não haveria risco de aumentar a inflação, assegura o professor.

Ele e Marilane concordam, ainda, que é o momento de cobrar impostos dos mais ricos, usar os recursos das reservas internacionais, tributar grandes fortunas, investidores, heranças, controlar os ganhos da especulação financeira. E, ainda, revogar a EC 95/2016. Para Marilane, este é o momento para discutir a centralidade da vida: nós não vamos viver só essa pandemia, vamos viver muitas catástrofes, novos ví­rus. Que sociedade nós queremos? . Aí­ entra a discussão sobre polí­ticas para idosos, crianças, cuidados, o que são atividades essenciais, ressignificar muitas dessas atividades a partir do entendimento do que é essencial para a vida.