Chegamos a novembro de 2020, um ano trágico e nefasto em mais aspectos do que possamos enumerar em uma coluna. Todas as vidas importam, e já perdemos mais de 165 mil, economia em colapso, a velha política e a corrupção sistêmica instaladas depois do engodo de algumas expectativas “ alienadas ou suspeitas “ de que o êxito do assombroso projeto conservador e perverso eleito em 2018, traria alguma mudança.
Neste ano, o serviço público seguiu sendo vítima de uma campanha de demonização como justificativa falaciosa para a dilapidação dos pilares que parcamente oferecem algum bem-estar à sociedade. As políticas públicas redistributivas, de promoção de direitos humanos, a proteção ao meio ambiente, o acesso a bens básicos e os princípios democráticos como um todo são destruídos como método. Atacam-se o SUS, a Fiocruz, o Ibama, o Butantã, as universidades federais… Os super-ricos não têm do que reclamar.
E quando pairam a crise sanitária, o anti-intelectualismo e o poder corroído por clãs ineptos de relações espúrias, somos, enquanto sociedade, ainda oferecidos em leilão com a ameaça da reforma administrativa. Precarizar os serviços públicos no Brasil atinge, majoritariamente, os alvos móveis de sempre: pretos pobres de periferia. Assim como sabemos quem são, onde moram e como vivem a maioria das vítimas da covid-19.
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E, num ano assim sombrio, a América do Norte convulsiona, afinal, a violência racial agora é transmitida ao vivo. E essa onda sísmica sacode o planeta; caem estátuas, projetos conservadores e anti-humanitários sofrem mais e mais derrotas nas urnas e um homem negro, ativista, torna-se o maior campeão de todos os tempos no esporte mais capitalizado e elitizado do mundo. A onda negra é singrada pelas mulheres! Engajamento, letramento, ocupação, solidariedade e sororidade… o canto das pretas velhas ecoando em todo lugar.
Meses se seguem e quase se empilham, diante das tragédias individuais e coletivas e chega novembro e, a despeito do terrível histórico deste ano, o mês de Zumbi dos Palmares chega envolto em luzes magníficas. Em novembro se escolhem os representantes legislativos da cidade “ do chão onde pisamos, literalmente “ e, 2020, a despeito de tudo, elegeu uma banca negra em Porto Alegre.
Pessoas ligadas às suas comunidades, pessoas diversas, experientes, cultas e gratas pelas políticas de cotas nas universidades, ascendem ao cenário político da cidade, não sem ataques de representantes decadentes das oligarquias políticas que são responsáveis “ porque ocuparam espaços de poder- pelo estado de coisas de que padecem a cidade e país.
Em novembro de 2020 celebraremos Zumbi! Mas, além disso, sabemos quem são Luiz Gama, Lélia Gonzáles, Oliveira Silveira, Conceição Evaristo. O cetro de patrono da Feira do Livro “ símbolo da primavera gaúcha “ também está em mãos negras de escrita talentosa! Evoé!
O Dia da Consciência Negra foi concebido em Porto Alegre em plenos anos de chumbo. 2020 é nosso ano de prata, e o futuro nos devolverá o brilho do ouro tirado da terra por nossos ancestrais.
Mario Augusto Silva Marques, diretor da Secretaria de Políticas Sociais do Sintrajufe, oficial de justiça da Justiça Federal POA, pós-graduado em Direito Processual Civil pela PUCRS. Integrante do GT Direitos Humanos, Equidade de Raça, Gênero e Diversidade da SJRS-JF
Magali Dantas, cientista social, mestra em Desenvolvimento e Governança, servidora da JF/POA e membra do GT Direitos Humanos, Equidade de Raça, Gênero e Diversidade da SJRS-JF