A BBC News publicou na última semana uma longa reportagem sobre um novo problema que vem sendo identificado por pesquisadores e pesquisadoras que estudam a situação da pobreza no Brasil. É o fenômeno das “hiperperiferias”, ou seja, periferias das periferias, onde os moradores são ainda mais pobres e encontram condições de vida ainda piores. O fenômeno vem se agravando no último período, com o aumento da pobreza no país.
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As “hiperperiferias” são conjuntos de moradias – geralmente fruto de ocupações irregulares – realizadas por pessoas que já não conseguiam sequer manter-se nas periferias das grandes cidades. Endividadas, sem conseguir emprego ou com trabalhos extremamente precários, sem apoio do governo, essas pessoas acabam tendo que vender por valores baixíssimos suas moradias nas periferias – ou abandonar os locais onde viviam de aluguel – e migrar para regiões ainda mais afastadas do centro das cidades, com condições ainda piores de saneamento ou de acesso à saúde e à educação para os filhos.
São assentamentos com barracos de madeira, esgoto a céu aberto, riscos de desmoronamento e outros problemas. Essas pessoas “podem ocupar áreas com risco de deslizamento, mananciais e pontos de preservação ambiental. Mas, ao contrário da periferia ‘mais antiga’, sofrem mais com a precariedade e falta de serviços públicos, e têm uma população mais vulnerável e com renda mais baixa. Alguns pesquisadores chamam esses lugares de ‘hiperperiferia’”, explica a reportagem.
Para Kazuo Nakano, professor do Instituto das Cidades da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), as hiperperiferias “são núcleos de ocupação recente, mais distantes e precárias, nas franjas da região metropolitana”. “Elas retomam esse padrão de casas de madeira, rua de terra e sem infraestrutura básica. É como se fosse a periferização da periferia”, diz o urbanista.
Conforme dados oficiais, o número de famílias em extrema pobreza na cidade de São Paulo cresceu 10% entre janeiro – quando problema já era grave – e julho de 2022. No Rio Grande do Sul, conforme dados são do 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil , divulgado pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar (Penssan), 14,1% dos domicílios registram insegurança alimentar grave, ou seja, fome. É o estado da região sul com os piores índices. Nacionalmente, são 33,1 milhões de brasileiros e brasileiras passando fome. Mais da metade (58,7%) da população brasileira convive com insegurança alimentar em algum grau, o que significa que 125,2 milhões de brasileiros estão nessa situação.
Bolsonaro faz pouco do problema e pode agravá-lo, apesar de ações eleitoreiras
O aumento da pobreza, da miséria e da fome tem sido minimizado por Jair Bolsonaro (PL) em reiteradas declarações, nas quais nega a realidade apontada pelos levantamentos e visível nas ruas. Para Bolsonaro, não há tanta fome assim no Brasil e os pobres estão desempregados porque “se acostumaram” a não ter uma profissão.
Para o ano que vem, a proposta de Orçamento que Bolsonaro enviou ao Congresso corta recursos que seriam fundamentais no combate à pobreza e que agora serão destinados a deputados e deputadas via orçamento secreto. Ações importantes tiveram cortes que variam de 95% a 97% na verba prevista para o próximo ano, como o Alimenta Brasil, programa que compra da produção agrícola de famílias e doa a comida para pessoas em situação de insegurança alimentar e nutricional.
Em 12 capitais brasileiras, incluindo Brasília, a cesta básica custa mais do que o valor do Auxílio Brasil – que chegou a R$ apesar da tentativa de Bolsonaro de aprovar valores menores. Isso significa que milhares de pessoas no país não estão conseguindo comprar sequer o mínimo para ter as calorias necessárias e se alimentar três vezes por dia se dependerem apenas do benefício para sobreviver.
A antecipação dos pagamentos do Auxílio neste mês trata-se apenas de uma medida eleitoreira, por meio da qual Bolsonaro busca fazer crer que se preocupa com a situação da população, exatamente o contrário do que mostram tanto suas declarações recentes quanto suas ações no governo. No Orçamento da União para 2023 enviado pelo governo ao Congresso, o valor previsto para o Auxílio Brasil no ano que vem é de apenas R$ 405.